quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Não esquecer

Vale a pena recordar a investigação da jornalista Felícia Cabrita sobre o que aconteceu ao Diogo Macedo, assassinado durante as praxes da tuna da Universidade Lusíada de V. N. de Famalicão.

"Diogo está esquecido no WC, junto aos lavatórios. As palavras saíam-lhe dos lábios, sem cor, em sussurros. Quando os olhos dele se enevoaram, como os de um afogado, alguém decidiu chamar a ambulância. No trajecto para o hospital, «Arrepio» ouve as versões dos outros sobre o que se teria passado: «Disseram-me que ele tinha sido praxado, que fizera umas 70 flexões. Pensei: ‘Ele se calhar fez alguma e foi castigado’. Mas não liguei as coisas. Os mais velhos falavam de indigestão». Certo e seguro, porque há registos indesmentíveis, é a hora a que Diogo deu entrada no Hospital de Famalicão, a uns metros da universidade, em coma profundo. Eram exactamente 22h51."

Ler o resto aqui.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Declaração conjunta dos órgãos de gestão da Faculdade de Psicologia e Ciências de Educação da Universidade do Porto

Os órgãos de gestão da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto vêm por este meio tornar público e notório o seu repúdio por toda e qualquer actividade dita de "praxe académica" que envolva humilhação, rebaixamento ou alguma outra forma de menorização de outrem, ainda que realizada sob presumido consentimento dos visados, porquanto se entende que a prática desse tipo de actos, seja de forma simulada ou efectiva, é incompatível com valores que a Faculdade procura formar e que são indissociáveis do exercício das profissões de base social e humana, de que é exemplo magno o respeito pelo outro.
Mais, além de por vezes propenderem para a tipificação de crimes públicos, os actos em causa são sempre atentatórios de direitos inalienáveis de quem a eles está submetido e de quem a eles assiste, designadamente daqueles consignados na Declaração Universal dos Direitos Humanos, onde se estabelecem os deveres de salvaguarda da igualdade de direitos, de protecção da dignidade e valor da pessoa humana, e de acção para com o outro em espírito de fraternidade.
Dando eficácia à deliberação conjunta dos órgãos da Faculdade, esta declaração será tornada pública pelo Conselho Directivo no início de cada ano escolar, pelos meios que melhor garantam a sua ampla disseminação junto da comunidade académica.

Porto, 15 de Julho de 2009

Os presidentes dos órgãos de gestão da FPCEUP

Fonte

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Comunicação sobre a praxe pelo Ministro do Ensino Superior

Comunicação dirigida pelo Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior aos presidentes do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas, Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos e Associação Portuguesa do Ensino Superior Privado, em 28 de Setembro de 2009.

«Nos últimos anos chamei repetidamente a atenção da comunidade académica e, em especial, dos responsáveis pelas instituições de ensino superior, para as situações degradantes em muitas circunstâncias identificadas ou desculpadas como «praxes» académicas.

Ainda no ano passado me dirigi às instituições de ensino superior solicitando a melhor colaboração dos seus responsáveis no sentido do combate a praxes que, embora afirmando uma intenção de integração dos novos alunos, mais não são que práticas de humilhação e de agressão física e psicológica de índole manifestamente fascista e boçal, indignas de uma sociedade civilizada e inconcebíveis em instituições de educação. A tolerância de muitos tem-se tornado cúmplice de situações sempre inaceitáveis e que, nalguns casos, conduziram mesmo a acidentes extremamente graves que produziram danos físicos irreversíveis e danos psicológicos porventura menos visíveis mas igualmente graves.

Como tive então oportunidade de referir, a extraordinária gravidade de algumas das ocorrências verificadas, configurando verdadeiros actos ilícitos de natureza civil, criminal e disciplinar, impõe uma atitude de responsabilidade colectiva nesta matéria e não permite qualquer tolerância com actos que — podendo e devendo ser prevenidos — revelam no espaço do ensino superior português insuportáveis violações do Estado de Direito.

A degradação física e psicológica dos mais novos como rito de iniciação é uma afronta aos valores da própria educação e à razão de ser das instituições de ensino superior e deve ser eficazmente combatida por todos: estudantes, professores e, muito especialmente, pelos próprios responsáveis das instituições.

Aos responsáveis pelas instituições de ensino superior, como educadores, incumbe desde logo não contribuir para a realização destas actividades de forma directa ou indirecta, através de recursos materiais ou não, ou de outras facilidades.

E cabe-lhes igualmente intervir de forma activa junto dos novos estudantes, e muito em especial daqueles que estão deslocados das suas localidades de origem, no sentido de os informar, com clareza, de que a recusa em participar nas «praxes» é não só um seu direito de pessoas livres, como não poderá trazer, em circunstância alguma, a perda de qualquer direito.

Das associações de estudantes, que num passado ainda bem recente, e em condições difíceis, pugnaram pelos valores da liberdade e da dignidade humana, espera-se um contributo activo, não só não acolhendo nem apoiando acções que, coberto de pseudo intenções de integração dos jovens estudantes põem objectivamente em causa aqueles valores, como promovendo iniciativas no sentido e uma verdadeira integração na comunidade académica.

O Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (Lei n.º 62/2007, de 10 de Setembro) veio traduzir esta realidade, qualificando como infracção disciplinar «a prática de actos de violência ou coacção física ou psicológica sobre outros estudantes, designadamente no quadro das "praxes académicas"» e cuja sanção pode ir da advertência à interdição da frequência da instituição. Este poder disciplinar pertence ao reitor ou ao presidente da instituição, podendo ser delegado nos directores ou presidentes das unidades orgânicas, sem prejuízo do direito de recurso.

Por outro lado, o Código Penal estipula, no seu artigo 10.°, que «quando um tipo legal de crime compreender um certo resultado, o facto abrange não só a acção adequada a produzi-lo como a omissão da acção adequada a evitá-lo».

Neste sentido têm, entretanto, os tribunais tomado posição sobre casos de praxe, condenando os seus autores e as escolas que a permitem e deixando bem claro, conforme vem sendo noticiado, que os actos praticados «vão para além do mínimo ético socialmente tolerável, mormente entre aqueles, como é o caso, que se inserem numa comunidade académica» onde se exige uma postura ética que não existiu e que «constitui ilícito civil a conduta de uma instituição de ensino superior que embora conhecendo o conteúdo de um código de praxe ofensivo, intimador e violador da dignidade da pessoa humana, permite que o mesmo continue a ser aplicado.»

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior reitera que sempre que tenha notícia da prática de ilícitos nas praxes, dela dará imediato conhecimento ao Ministério Público, bem como lançará mão dos meios aptos a responsabilizar civil e criminalmente, por acção ou omissão os órgãos próprios das instituições do ensino superior, as associações de estudantes e ainda quaisquer outras entidades que, podendo e devendo fazê-lo, não tenham procedido de modo a procurar evitar os danos ocorridos.

Solicito pois mais uma vez a V. Exa. que, no início deste ano lectivo, transmita aos responsáveis das instituições a presente comunicação, apelando à colaboração e acção de todos nesta matéria.

O Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior
José Mariano Gago»

O original pode ser encontrado aqui.

Análise ao "Código de Praxes" da UALg

Encontrei à uns dias, através desta notícia, o Código de Praxes da Universidade do Algarve. Não resisti a fazer uma análise séria, embora com partes inevitavelmente satíricas, tentando demonstrar várias contradições e idiotices dos "documentos oficiais" da praxe. O original pode ser encontrado aqui.

"No entanto, jamais devemos esquecer a verdadeira essência da PRAXE! A PRAXE Académica não é, e ao contrário do que muitos tendem a pensar, a tradicional Semana de Recepção ao Caloiro, com pinturas e brincadeiras por vezes absurdas. A PRAXE vai muito para além disso. A PRAXE é o saber viver bem todo um percurso académico. Significa o respeito mútuo, a camaradagem, a entreajuda, os cerimoniais, o convívio, a integração num meio universitário, completamente novo para todos os novos alunos. A própria palavra latina PRAXIS significa prática, modo de agir."

Este excerto vem no seguimento da adequação da "tradição" aos novos tempos, nomeadamente ao Processo de Bolonha. Entra já aqui numa falácia, a praxe é muita coisa, e também é a semana de recepção ao caloiro, as pinturas e "brincadeiras" normalmente absurdas. O percurso académico vivido através da praxe não significa nenhum respeito mútuo, não existe entreajuda quando se está de gatas a gritar banalidades sexuais. A praxe integra na praxe, não integra no espaço universitário, não dá a conhecer coisas novas, nem existe uma troca de experiências e pensamentos, mas apenas a imposição de normas decididas pelos estudantes com mais matrículas.

Não existe respeito algum pelos alunos do primeiro ano. Fala-se de acolher "condignamente os recém-chegados alunos" no 2º artigo, enquanto que no 3º artigo a definição desse alunos passa a "bestas". Os supostos objectivos da praxe entram em contradição precisamente com a prática. No 4º artigo passamos para a dispensa de um aluno recém-chegado ser praxado e aqui entram precisamente os documentos oficiais da praxe: a declaração feita por uma comissão de praxe para provar que um aluno que tenha mudado de instituição já foi antes praxado; e uma declaração de um aluno anti-praxe solicitando essa condição. Ora, eu sempre pensei que se não quisesse andar de gatas e andar pintado me bastaria dizer "não quero", tendo em conta que a Constituição Portuguesa (artigos 26º, 27º, 37º são bons exemplos) e a Declaração Universal dos Direitos Humanos (e aqui vale a pena ler o , e 19º) ainda têm um valor legítimo. Claro que a solicitação deste papel implicará a exclusão do estudante de todas as actividades organizadas pela Associação Académica da UALg.


O 5º artigo define a hierarquização da "tradição académica". Os estudantes não são todos iguais. Existem as bestas que são os estudantes acabados de entrar na instituição, praxados, mas sem terem passado pelo "baptismo"; após essa actividade aquática passam a ser perus; após a semana académica passam à condição de caloiros; torna-se numa gangrena se reprovou mais de metade do 1º ano; macebo se está no 2ª matrícula sem essas reprovações (pode ter chumbado); finalmente entra nos adjectivos mais simpáticos na 3ª matrícula, passa a ser académico (mesmo que esteja no 1º ano); será veterano com quatro matrículas; passará à condição de velha guarda com cinco ou mais matrículas.

Depois define-se os locais que são interditos à praxe. Debaixo das mesas não se pode praxar porque estas terão líquidos essenciais à vida (deduzo que sejam bebidas alcoólicas), não podem estar agarrados com os quatro membros a uma árvore porque estas são sagradas à vida. E claro, os locais de culto não são locais de praxe porque os abutres respeitam o divino (ao contrário do que acontece pelo respeito pelo próximo). Novamente, por respeito, de baixo das capas dos insigne persona (qualquer praxista que esteja acima do grau de "académico") são proibidas as praxes (a presença de) a estudantes recém-chegados.

O fechamento da praxe é estipulado no II capítulo: é anti-praxe quem recuse o que está estipulado no regulamento inventado por essa gente. O anti-praxe perde direitos como praxar, ser designado por aqueles magníficos títulos descritos anteriormente, usar o traje (sim, porque esta gente manda na roupa de cada um, como a Mocidade Portuguesa), e podem bem esquecer os jantares de curso e convívios organizados por quem se traje e seja académico (ou superior). Vá lá, pode estudar que eles deixam, agora não querem é ser amigos de quem não se veste de preto.

Depois importa informar o que raio são as pessoas (homo sapiens sapiens) recém-chegadas e por que são diferentes dos outros que estão na Universidade há mais tempo (homo sapiens sapiens, quem diria!). São "reles bestas". Têm um "BI" que é tipo o passe para andar nos transportes públicos, tem de ser mostrado sempre que qualquer trajadinho armado em revisor o peça. Mas é um documento importante, porque para além do nome (imagino...) e o curso tem lá escrito o grupo sanguíneo e eventuais problemas de saúde que a "besta" tenha. Querem maltratar estas pessoas, mas não as convém estragar demasiado porque depois cai mal. A "besta" é um "ser inferior" (espírito de solidariedade, camaradagem e entre-ajuda, lembram-se?) que tem direitos: cumprir os seus deveres (não decididos pelos próprios); pode, vá lá, declarar-se anti-praxe (e não se misturar com aquela gente); ser tratado "condignamente", porque não querem ir "contra a condição de ser humano" (besta?); escolher um padrinho ou uma madrinha; e receber um nome de praxe para "caracterizar a condição de besta". Simpático.

E há, pois claro, deveres: comparecer sempre nos eventos organizados pelos "ilustres académicos" (se não... o quê?); "ser moderado no uso da palavra", que significa apenas responder "quando interpelado" (quem cala consente); tem de ser "servil, obediente e resignado" (abolição da escravatura já foi há 100 anos, não?); não se pode masturbar, nada de "actos misóginos ou apandríacos" (pesquisa no Google dá como único resultado este "código"); “a besta não ri, logo não mostra os dentes” (é uma alegria a praxe); não olhar nos olhos dos seus superiores; nem fumar (deve ser pela saúde); o estudante do 1º ano tem de se manter sempre num plano inferior ao dos praxantes (todos iguais, portanto); estar sempre respeitoso em relação aos trajados que não os respeita; voluntariar-se quando vê colegas a serem praxados; não reclamar (esqueçam espírito crítico); se não tiver em aulas terá de ser praxado (esqueçam lá fazer outras coisas, como ir ao cinema ou passear); não falar mais alto que a corja trajada; gritar pelo seu curso (ou como eles dizem: “canaliza(r) todo o seu potencial vocal para aclamar vorazmente o seu curso”); suplicar para ser praxado (mesmo que não lhe apeteça, deduzo); não falar ao telemóvel, exceptuando se receber autorização (isto lembra-me algo...); zelar pelo bem estar e conforto dos praxistas (yep, escravatura); não andar sozinho na rua (poderá ficar parado?); ocupar o último lugar na fila; e como é ignorante procura conhecimento (?). Muito simpático. Adorava ser recebido assim.

Os perus por outro lado já têm uma vantagem. Podem ser comercializados pelo código da livre concorrência (a praxe é capitalista). Este já pode namorar, se autorizado pelo padrinho/madrinha; e usar o traje se autorizado. O caloiro é um mero título menos mau. Mancebo é um ajudante que não praxa. Finalmente o académico tem direito a praxar "sobre o seu curso"; é responsável pela praxe que fizer; elege os perus do ano; ensina mancebos a praxar; e arma-se em bufo: identifica os que se declararam anti-praxe. O veterano já pode praxar a sua unidade orgânica, ou seja, vários cursos. A felicidade!

Existe depois a recepção ao caloiro. Começa com o "dia da indiferença", em que a "besta" é tão reles que os praxistas "não gastam saliva para falar, gritar e até mesmo ordenar" com eles. Há depois um desfile pela cidade, culminando numa banhada (baptismo, dizem eles - seguindo a boa lógica cristã). Há garraiada amadora, suponho que sem touros, mas estou por confirmar essa informação. Há a "sapatada", que é um leilão de pessoas (sim, voltamos aos escravos e à pessoa-mercadoria) por uma noite; uma missa do caloiro não religiosa; uma procissão com velas (dizem que é algo de submissão, são eles que o dizem); alcoolização dos perus (vão beber copos, tanta coisa para irem beber copos como toda a gente); a serenata onde se canta fado de Coimbra/académico (é a tradição, ainda que se esteja em Faro). Sobre a limitação das praxes, depois disto tudo, há uma frase: "Durante todo o longo processo de praxes, há que existir um respeito mútuo entre praxantes, assim como estes deverão zelar pela correcta aplicação do presente código.". É isto, sim, claro.

Há depois um órgão, o "Tribunal de Praxe", que executa as sanções da praxe, para além de zelar pelo correcto uso do traje/farda académico/a. Se houver algo fora do normal encaminham o caso para a Associação Académica, que logo reencaminhará para as autoridades competentes. Marcar o 112 dá muito trabalho. Ora, existem juízes, jurados, um advogado de acusação e um carrasco. E claro, réus e advogados de defesa (?) (os padrinhos/madrinhas).

Ora, e assim termina esta análise. Existe muito espaço aberto para coisas dúbias e todo o tipo de violências físicas e psicológicas. A praxe é isto, a praxe é merda.

Youri Paiva

domingo, 27 de setembro de 2009

Comunicado de imprensa sobre decisão do Tribunal no caso da morte de Diogo Macedo

Tribunal considera Direcção de Universidade responsável pelos acontecimentos em torno da morte de Diogo Macedo

Ontem o Tribunal Cível de Famalicão reconheceu a responsabilidade da Universidade Lusíada de Famalicão nos acontecimentos em torno da morte de Diogo Macedo.

Em Outubro de 2001 Diogo Macedo, estudante do 4º ano de Arquitectura e membro da tuna, morreu devido a lesões cérebro-medulares, após acontecimentos ainda por esclarecer na noite em que aparentemente tinha decidido abandonar a tuna por não suportar mais as praxes a que era submetido. Inicialmente a morte tinha sido considerada acidental, mas as suspeitas de um médico do Hospital de S. João fizeram com que mais averiguações fossem efectuadas, tendo a autópsia demonstrado múltiplas escoriações corporais, além da fractura de uma vértebra cervical contraída por agressão e que teria sido a causa da morte.

Na sequência destes factos, dois elementos da tuna foram constituídos arguidos. Contudo, o processo foi arquivado em 2004 por falta de provas, uma vez que seria “impossível imputar à acção de qualquer pessoa concreta a produção das lesões”. Inexplicavelmente, apesar de estarem perto de 20 pessoas nas mesmas instalações que Diogo, nenhuma destas se recordava dos acontecimentos. Após a morte reuniram-se de urgência para alegadamente gizar versões, oportunamente criando uma amnésia colectiva que se apoderou dos “amigos” e “colegas” de Diogo, impedindo-os de fornecerem qualquer pormenor. Numa sessão de tribunal em que as testemunhas estavam a ser ouvidas, o próprio juiz reconheceu o "muro de silêncio" que tinha sido criado. Uma única versão conjunta de nada.

Depois do processo-crime, segue-se o processo cível. A mãe de Diogo Macedo pede uma indemnização de 210 mil euros à Fundação Minerva, que detém a Universidade Lusíada. O tribunal deu como provada a morte, em consequência de lesões provocadas. Este e outros dados levaram o Tribunal Cível de Famalicão a dar como provada a morte do estudante, em consequência de uma pancada, alegadamente, desferida durante a praxe. Estamos agora em Junho de 2009, oito anos após a morte de Diogo Macedo.

Ontem assistimos a uma decisão semelhante à de outros Tribunais relativamente a casos de praxe, numa tendência crescente de responsabilização das faculdades sobre as praxes que nelas se passam. O Tribunal de Vila Nova de Famalicão considerou que a Universidade Lusíada de Famalicão (ULF), não controlou nem evitou as praxes académicas, sendo obrigada a pagar uma indemnização de 90 mil euros à família de Diogo. O Tribunal considerou provado que “Nunca a ré (universidade) teve algum controlo efectivo sobre esse tipo de praxes violentas e humilhantes. Não temos notícia que alguma vez tenha proibido a violência mencionada, aliás os factos apurados mostram a ausência de intervenção”, tendo ainda acrescentado que "Existe uma clara interdependência” com a ULF “que lhe cede espaço, subsidio e publicidade, em troca de evidente publicidade e charme académico que esse tipo de grupos traz à sua academia”.

Este caso merece várias considerações:

- Estranhamente, apenas 3 anos depois da morte de Diogo Macedo os acontecimentos foram tornados públicos, em grande parte devido a uma Grande Reportagem da autoria de Felicia Cabrita. Esta jornalista, numa semana de investigação no local, descobriu mais do que as polícias em três anos – isto, apesar da direcção da Lusíada ter ameaçado de expulsão qualquer aluno que lhe prestasse declarações! Por outro lado, os relatos da mãe deixam claro que a escola sempre soube o que aconteceu; inclusivamente, tentou sempre silenciar as suas tentativas para descobrir as causas da morte do seu filho. Ao que parece, o poder da Universidade Lusíada conseguiu silenciar as vozes que poderiam esclarecer as circunstâncias em que este aluno morreu.

- Nesta tuna (e em todas as outras tunas universitárias), a democracia é inexistente, assim como as regras básicas de respeito pela expressão individual. O relacionamento é totalmente condicionado por uma hierarquia absolutamente rígida. Quem as integra obedece a uma autêntica estrutura de castas com claro prejuízo para quem está "mais abaixo" na cadeia. Este era o caso do Diogo, que apesar de já a integrar há 4 anos continuava a ser "caloiro" e alvo de animosidade, a qual esteve na origem da sua decisão de abandonar o grupo.

- À semelhança do que se passa noutras instituições do Ensino Superior, é evidente a conivência entre Direcções e grupos de estudantes que têm como base a hierarquização, submissão e proliferação de comportamentos repressores e inerentemente violentos. Isto exige uma reflexão por parte da Sociedade e das Instituições sobre aquilo que são e sobre o que pretendem oferecer aos seus alunos. Não podemos perpetuar estas "tradições" imaginárias que se apoderaram do vazio cultural e intelectual que tem caracterizado as escolas nestes últimos anos.

- Este caso extravasa os contornos praxísticos, a gravidade é a de um homicídio. Homicídio que ocorreu no contexto da praxe, numa tuna, entre estudantes, nas instalações de uma Faculdade do Ensino Superior. Estes factos obrigam-nos a pensar na arbitrariedade da "tradição". A "tradição" não pode cobrir de impunidade actos como este, os muros têm de ser derrubados e permitir que a verdade venha ao de cima.

27 de Setembro de 2009

M.A.T.A. - Movimento Anti-"Tradição Académica"


Notícias:

A Bola: Universidade vai pagar indemnização por morte durante praxe
Correio da Manhã: Lusíada condenada por morte
Diário de Notícias:
Aluno morto há 8 anos em praxe por pancada com revista
Esquerda.net: Praxe: Univ. Lusíada condenada em tribunal
i: Tribunal acusa: Universidade Lusíada não evitou praxe mortal
Jornal de Notícias
: Universidade paga indemnização por morte de aluno em praxe
Público: Condenação da Universidade Lusíada leva MATA a pedir reflexão sobre praxes


Blogues:

Frenesi (Paulo da Costa Domingos): «Bom dia, Segue o comunicado...»
Jugular (Maria João Pires): Comunicado do M.A.T.A.
Pimenta Negra (Viriato): Tribunal condena Universidade Lusíada ( comunicado do Movimento anti-tradição académica)

sábado, 26 de setembro de 2009

Mais uma Faculdade responsabilizada por praxe extremamente violenta

Lusíada condenada por morte
Ensino Superior: Universidade paga indemnização por praxe violenta
Correio da Manhã, 26 de Setembro de 2009

A Universidade Lusíada, de Vila Nova de Famalicão, foi condenada por omissão de acção, no caso da praxe violenta, ocorrida em Outubro de 2001, no seio da tuna académica, e que resultou na morte de Diogo Macedo, de 22 anos, aluno de Arquitectura.
Na decisão do processo cível, que foi conhecida esta semana, o Tribunal de Famalicão determinou o pagamento à família, por parte da Lusíada, de uma indemnização de 90 mil euros, tendo considerado, no essencial, que a instituição de ensino não fez tudo o que podia no controlo das praxes violentas.

“Se tivesse controlado as práticas de agressividade física e psicológica, tinha contribuído para que a morte não tivesse ocorrido”, diz a sentença, referindo “comportamentos de pseudopraxe mais próprios da instrução militar”.

Este foi um dos casos mais graves ocorridos em universidades portuguesas, ao nível das praxes violentas, entretanto interditas. Diogo Macedo era estudante do 4º ano de Arquitectura, mas era caloiro na tuna, onde, segundo confessou à mãe, foi várias vezes maltratado. Aliás, na noite fatídica, ao sair de casa, disse à mãe que “ia resolver uns problemas na tuna”.

Era dia de ensaio e os rituais da praxe imposta pelos mais antigos foram mais violentos do que o habitual. Diogo Macedo morreu, no Hospital de S. João, no Porto, devido a vários traumatismos.

O processo-crime relativo a este caso, com base na queixa apresentada pela família, acabou arquivado por falta de provas. E, apesar de todas as diligências do Ministério Público e investigações da Polícia Judiciária, nunca se chegou a saber quem matou Diogo Macedo. É que os elementos da tuna reuniram e combinaram uma versão, falando em acidente, da qual nunca saíram e que impediu, segundo a família, a descoberta da verdade. Com o arquivamento do processo-crime, a família entendeu avançar com um processo cível e o tribunal acabou agora por lhe dar razão.

Esta decisão pode levar à reabertura do processo-crime, embora a advogada da família, Sónia Carneiro, esteja céptica. “Atendendo ao muro de silêncio em torno do caso, vai ser muito difícil avançar no que quer que seja e a reabertura não se faz sem um dado novo considerado relevante”, disse ao Correio da Manhã.

Sobre este caso neste blog: 22.06.09, 27.10.08
Esta notícia no i online, no esquerda.net

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

MATA na Sociedade Civil

Hoje a Daniela, do MATA, foi ao programa da RTP2 Sociedade Civil.
Quem não viu a transmissão televisiva pode ver o programa completo aqui.

Aqui fica também o blog da Sociedade Civil, onde muita gente deixou (e ainda está a deixar) o seu comentário sobre o tema de hoje: as praxes.
http://sociedade-civil.blogspot.com/2009/09/praxes-tradicao-ou-prepotencia.html