terça-feira, 30 de novembro de 2010

A retaliação na praxe

Postámos há uns dias, aqui, um exemplo da persuasão usada para arrastar caloiros para as praxes. Eram bastante evidentes nesta passagem - "Isto porque já não têm que estudar e não admitimos qualquer tipo de desculpa. Estão já avisados que quem não for à praxe esta semana as consequências não vão ser as melhores, porque os doutores esforçam-se por vocês e vocês são uns ingratos (...)"-, três formas típicas de persuasão:
"criminalização" da falta à praxe - "Isto porque já não têm que estudar e não admitimos qualquer tipo de desculpa"
retaliação pela falta à praxe - "Estão já avisados que quem não for à praxe esta semana as consequências não vão ser as melhores"
Chantagem emocional - "porque os doutores esforçam-se por vocês e vocês são uns ingratos"
A reacção não tardou, e os visados vieram que nem damas ofendidas contestar aquilo que constatávamos. Contestar, como quem diz, porque não se viram argumentos nem contra-argumentos, apesar de apresentarmos um raciocínio suficientemente coerente para qualquer um perceber.
Mas passando à frente, porque a vontade que os visados demonstraram em fazer valer as suas opiniões foi nula - um acto típico de bárbaros -, encontrámos este aviso, que se reproduz abaixo.
É um bom exemplo da retaliação à falta à praxe. Evidente; claro como água; incontestável. Sendo assim, fica a questão:
Mas porque faltam os caloiros à praxe?

AVISO
Soube que na última praxe , a qual adiámos para quinta-feira porque na quarta-feira tinham que estudar, que foram apenas 6 caloiros. Por este motivo e não só, esta praxe valerá por 2, e nas próximas praxes em que tal aconteça vão começar a valer mais. Aviso também que nunca mais serão mudadas praxes por causa dos caloiros, quando houver praxe há e ponto final.
Informo também que haverá praxe do CV, esta quinta-feira dia 2 de Dezembro, fiquem atentos aos avisos na entrada da AE.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

A praxe origina rivalidades absurdas

Num post mais atrás - Maravilhoso para mostrar o discurso de tom intimidatório e o carácter obrigatório e não-agradável da praxe - numa resposta a um comentário referimos um ponto que nos parece importante e que caracteriza a praxe. Nesse ponto dizemos, e passo a transcrever:
"(...) a praxe (...) separa as pessoas em cursos, anos, faculdades e cidades diferentes, fomentando uma rivalidade absurda que já originou, por várias vezes confrontos entres estudantes (...)"
E agora aparece-nos a notícia de que a praxe é proibida no Instituto Politécnico de Castelo Branco e o motivo para tal decisão são os "actos de vandalismo", "os conflitos" e "os distúrbios que ocorreram em plena Av. Nuno Álvares, junto à Câmara Municipal de Castelo Branco, alegadamente devido à escolha da Escola Superior de Educação como vencedora do cortejo."
Uma rivalidade entre escolas provavelmente alimentada pelas praxes.
Enfim, fica à vossa reflexão.

Seguem-se as notícias de 3 jornais:

Politécnico proíbe praxes dentro das escolas
25 de Novembro de 2010, José Furtado, Jornal Reconquista
Os actos de vandalismo ocorridos na Latada motivaram a decisão de Carlos Maia, que exige uma reorganização das praxes.

O Instituto Politécnico de Castelo Branco proibiu a realização de qualquer actividade relacionada com as praxes nas instalações das escolas. Na base desta decisão estão os actos de vandalismo verificados no dia da Latada, a 10 de Novembro. Os distúrbios ocorreram em plena Av. Nuno Álvares, junto à Câmara Municipal de Castelo Branco, alegadamente devido à escolha da Escola Superior de Educação como vencedora do cortejo.
No dia seguinte o presidente do Politécnico, Carlos Maia, convocou para uma reunião o presidente da Federação Académica do Instituto Politécnico (Facab), as associações de estudantes e os representantes das comissões de praxe. Do encontro saiu a decisão de “suspensão, por tempo indeterminado, dos apoios às actividades relacionadas com a praxe”, bem como a proibição também por tempo indeterminado “da realização de qualquer actividade relacionada com a praxe, nas instalações do IPCB e nas suas unidades orgânicas”.
O presidente da Facab, assume que os acontecimentos que levaram a esta decisão do presidente do Politécnico “não são nada dignos” e diz entender a posição de Carlos Maia neste processo.
Paulo Madeira demarca-se dos acontecimentos, mas diz também que os distúrbios poderão ter sido provocados por alguns elementos exteriores ao Politécnico.
O levantamento da suspensão decretada pelo Politécnico está agora dependente da reorganização das praxes, explica o dirigente da Facab, que deverá emitir em breve um comunicado sobre o assunto.

Castelo Branco: praxes suspensas após distúrbios na latada
25 de Novembro de 2010, Diário Digital / Lusa
Qualquer actividade relacionada com as praxes está proibida nas instalações das seis escolas do Instituto Politécnico de Castelo Branco (IPCB). A proibição surge na sequência de actos de vandalismo ocorridos há duas semanas na latada.

Os actos de vandalismo terão sido motivados por um alegado descontentamento em relação à escolha da escola vencedora do cortejo. Os mesmos actos de vandalismo levaram à convocação, pelo presidente do Politécnico, de uma reunião com o presidente da Federação Académica do Instituto Politécnico (Facab), associações de estudantes e os representantes das comissões de praxe.
Do encontro saiu a decisão de «suspensão, por tempo indeterminado, dos apoios às actividades relacionadas com a praxe» e da realização de qualquer actividade relacionada com a praxe, «nas instalações do IPCB e nas suas unidades orgânicas», refere um despacho do Politécnico ao qual a agência Lusa teve acesso.
O levantamento da suspensão está dependente da reorganização das praxes, disse também à Lusa o presidente da instituição, Carlos Maia.
A Facab diz entender a posição do presidente do IPCB e o presidente da federação assumiu que os acontecimentos que levaram a esta decisão «não são nada dignos». Paulo Madeira admitiu, no entanto, que os distúrbios poderão ter sido provocados por alguns elementos exteriores ao Politécnico.

Politécnico de Castelo Branco suspende praxes após distúrbios na latada
por Agência Lusa , 25 de Novembro de 2010
O Instituto Politécnico de Castelo Branco (IPCB) proibiu a realização de qualquer atividade relacionada com as praxes nas instalações das suas seis escolas, após atos de vandalismo ocorridos há duas semanas na latada.

Os atos de vandalismo terão sido motivados por um alegado descontentamento em relação à escolha da escola vencedora do cortejo e levaram à convocação, pelo presidente do Politécnico, de uma reunião com o presidente da Federação Académica do Instituto Politécnico (Facab), associações de estudantes e os representantes das comissões de praxe.
Do encontro saiu a decisão de "suspensão, por tempo indeterminado, dos apoios às actividades relacionadas com a praxe" e da realização de qualquer atividade relacionada com a praxe, "nas instalações do IPCB e nas suas unidades orgânicas", diz um despacho do Politécnico ao qual a agência Lusa teve hoje acesso.
O levantamento da suspensão está dependente da reorganização das praxes, disse à Lusa o presidente da instituição, Carlos Maia.
A Facab diz entender a posição do presidente do IPCB e o presidente da federação assumiu que os acontecimentos que levaram a esta decisão "não são nada dignos".
Paulo Madeira admitiu, no entanto, que os distúrbios poderão ter sido provocados por alguns elementos exteriores ao Politécnico.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Algumas notícias sobre a greve no Ensino Superior

"A greve foi um sucesso", garantem as organizações de trabalhadores, como a CGTP e a UGT. O governo e as associações patronais dizem o contrário. Já sabemos da discrepância entre os números de uns e os dos outros. E que "na origem de discrepâncias tão grandes nos números da greve geral estão as diferentes metodologias usadas pelos sindicatos e pelo Governo. Enquanto a taxa de adesão apurada pelos primeiros resulta do número de trabalhadores em greve sobre os que deviam estar ao serviço naquele dia, o Estado e a maioria das empresas faz o cálculo tendo por base a totalidade dos trabalhadores."
No entanto, parece-me que os sindicatos usam uma metodologia mais honesta que os governos. Apesar dos jornais e televisões preferirem sempre os segundos...

Mas, aqui ficam algumas notícias sobre a greve geral em universidades. (A notícia do jornal público só apresenta os valores "oficiais" de adesão à greve...)

Greve geral: adesão entre 40 e 95% no Ensino Superior - SNESup
Diário Digital

O Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup) disse hoje que «os objetivos foram atingidos» na greve geral, com taxas de adesão entre 40 por cento, na Universidade de Coimbra, e 95 por cento, numa escola do Instituto Politécnico de Lisboa.
Com 90 por cento de adesão à greve geral de hoje - diz o SNESup em comunicado - estiveram a Universidade do Algarve, a «maior parte das faculdades» da Universidade de Lisboa e «alguns departamentos» da Universidade da Beira Interior.

Também a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e a Faculdade de Arquitetura da Universidade Técnica de Lisboa registaram uma adesão à greve da ordem dos 90 por cento, segundo a estrutura sindical.
A Escola Superior de Comunicação Social, do Instituto Politécnico de Lisboa, foi a que, de acordo com o sindicato, teve uma maior adesão ao protesto, com 95 por cento.
Com uma expressão menor, a Faculdade de Letras da Universidade do Porto e o Instituto Politécnico do Porto registaram uma adesão à greve geral de 50 por cento.
Na “maior parte das faculdades” da Universidade de Coimbra a taxa de adesão à greve geral foi de 40 por cento.
Por isso, hoje “não foi um dia normal no Ensino Superior”, uma vez que “um pouco por todo o país os docentes e investigadores mostraram a sua adesão à greve neste dia paralisando as suas actividades”, lê-se no comunicado.
O SNESup dá ainda conta de “uma greve com adesão significativa entre os funcionários não docentes” e da “não comparência de alunos”.
O sindicato adianta que “irá prosseguir com a convocação de uma concentração nacional junto ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior”, porque o ministro Mariano Gago “ainda não respondeu ao pedido de reunião que o SNESup formulou em 04 de outubro”.

A CGTP e a UGT realizam hoje uma greve geral conjunta contra as medidas de austeridade, anunciadas pelo Governo em setembro, que têm como objectivo consolidar as contas públicas, entre as quais os cortes de salários nos trabalhadores do Estado, o congelamento das pensões em 2011 e o aumento em dois pontos percentuais do IVA.
Esta é a segunda greve geral marcada pelas duas centrais. A primeira realizou-se há 22 anos contra o pacote laboral.

Faculdade de Letras de Universidade de Lisboa
Precários Inflexíveis
Grupo de Estudantes com o apoio da direcção da Associação de Estudantes estão em piquete na Faculdade de Letra da UL. O piquete garante que não há aulas na faculdade.
O pessoal não docente também fez greve (a rondar os 80%) enquanto que o pessoal docente está quase completamente ausente, aderindo à greve perto de 100% dos professores da faculdade.

FCSH Lisboa :: PSP identifica estudantes com justificação de que estudantes estão a fazer manifestação
Precários Inflexíveis
Os agentes da PSP justificam que estão a identificar os estudantes porque estes estão a realizar uma manifestação não autorizada pelo Governo Civil.
Portanto, o ridículo que os agentes Flávio Simões e Jorge Arnauth da PSP assumem, confronta o mais lato entendimento de democracia e liberdade num dia de Greve Geral.

FCSH Lisboa :: PSP identifica estudantes e monta aparato policial sem justificação legal
Precários Inflexíveis
A faculdade garante que não chamou a policia. Quem o terá feito? O aparato é ridículo. Duas viaturas e meia dúzia de agentes.

FCSH Lisboa :: PSP entra na faculdade e identifica estudante
Precários Inflexíveis
O número de agentes da PSP a pressionar os estudantes em piquete na FCSH aumentou para 4. Desta vez, os agentes identificaram alguns estudantes apenas por estes estarem no piquete de contacto, algo que não está a coberto da lei. Para além desse facto, 2 dos agentes entraram na faculdade sem qualquer pedido de qualquer responsável, e inclusivamente foram "convidados" a sair pelo Director da faculdade e por um responsável do Conselho Pedagógico.
A pressão da polícia sobe assim de gravidade na FCSH mas os estudantes mantêm-se firmes e determinados, garantindo que até ao momento não existam aulas a funcionar.

Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da UNL :: Colectivo A Garra com piquete de greve com 20 estudantes
Precários Inflexíveis
Os estudantes d'A Garra em piquete/concentração na Greve Geral na porta da FCSH, apontam para uma greve total às aulas.
Os serviços mínimos para abertura das aulas na FCSH não estão garantidos com cantina fechada. Também o bar da faculdade - Sabor a Nova - se manterá fechado.
80% de greve nos funcionários auxiliares e de limpeza.

Universidade de Coimbra com aulas mas menos almoços
24.11.2010, Por Maria João Lopes, Jornal Público
Na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra (UC), hoje de manhã o calendário ainda marcava 23 de Novembro. Faltou alguém para virar a folha para 24, dia de greve geral em que, naquele edifício situado na alta universitária, se registou uma adesão de 40 por cento. À porta, um papel afixado avisa os frequentadores do espaço dos constrangimentos: a biblioteca estará encerrada durante a hora do almoço e, ao fim do dia, em vez de fechar as portas às 22h00, fá-lo-á às 17h30. Além disso, não é possível fazer requisições de livros para levar para casa.

“Está tudo a funcionar, mas com o horário reduzido. E também não temos empréstimos domiciliários por insuficiente número de pessoas nos depósitos. Eu sou a favor da greve, estou cá a trabalhar porque tem que ser. E não acho justo pedir a quem vem trabalhar que faça mais do que o costume”, diz o director-adjunto da biblioteca, Maia Amaral, à porta do edifício.

Por voltas das 10h00, ainda há muitos lugares livres para se estacionar no pólo I da universidade – coisa rara. Também as pessoas que passam naquela alameda – à excepção dos turistas – são menos. Houve estudantes não apareceram nas faculdades, embora grande parte dos professores tivesse ido dar as aulas. Alguns em protesto contra a situação do país, como o docente de Direito Constitucional, João Loureiro, que levou duas t-shirts com frases estampadas como “restaurar a democracia, acabar com a partidocracia”.

“Vim dar as aulas normalmente, não quero que haja confusão com a minha atitude. Mas não posso concordar com esta vergonha. Eu até defendo os cortes, pode é não ser nestes moldes…Se viesse sem nada, podia ser confundido como concordante com o estado das coisas”, diz o docente.

Na escadaria da Faculdade de Letras da UC, um grupo de alunos de Estudos Artísticos apanha os ainda tímidos raios de sol da manhã. Estão a fazer uma pausa: “Tivemos aulas normalmente. Acho que os professores não estão a faltar”, diz Diogo Pinto, de 19 anos, acrescentando, porém, que estão menos alunos nas salas.

Os corredores das Letras estão mais desertos do que o habitual, embora, de uma forma geral, os serviços estejam a funcionar. Foi o vigilante Valdemar Madeira, funcionário de uma empresa subsidiária que trabalha para UC, quem abriu a porta de manhã.

O director da Faculdade de Letras, Carlos André, garante que, entre os 80 funcionários não docentes da faculdade de letras, a adesão ficou-se pelos 36 por cento - apenas no gabinete que se dedica às questões informáticas é que aderiram todos os trabalhadores. “Agora, os serviços académicos, o gabinete de apoio ao director, que é por onde entra e sai todo o correio, isso está a funcionar”, acrescenta. Quanto ao bar, à limpeza, ao serviço de fotocópias e à livraria - serviços que funcionam em regime de concessão, não incluem funcionários da UC – também não se fizeram notar grandes efeitos.

Na Faculdade de Letras há, porém, algumas salas de leituras encerradas, entre as quais a de História da Arte, por exemplo. “Mas os professores têm a chave de acesso”, ressalva o director. Quanto aos docentes, não há, para já, números definitivos. Em 200, apenas cinco entregaram uma carta a comunicar que estão em greve, mas o director sabe que o número será superior. Ainda assim, Carlos André reconhece que “a faculdade está muito morta”, até porque muitos alunos faltaram, por suspeitarem que poderia não haver aulas.

Não foi o caso de Mariana Mendes, de 19 anos: “Só tinha uma aula de três horas, mas o professor não faltou”, diz a aluna de Direito, sentada numa paragem de autocarro. “O meu pai trouxe-me de manhã, mas, como vi o 103 a passar, estou à espera…”, acrescenta.

A hora de almoço aproxima-se e é precisamente nas cantinas, que são geridas pelos Serviços de Acção Social da UC, que mais se sentem os efeitos da greve. A maior parte delas está fechada: a do Pólo II, as Cantinas Amarelas, as Azuis, a Sereia… A funcionar, só há duas: a das Químicas e a do Pólo III.

Os estudantes de engenharia André Cardoso, Joni Sousa e Vítor Sousa foram às aulas de manhã, mas à hora de almoço esbarraram no aviso que está à porta da cantina no Pólo II. Os refeitórios que estão abertos ainda são longe e há poucos autocarros a passar…“É uma boa questão, onde vamos comer?”, diz, entre risos, o estudante de informática de 20 anos, Joni Sousa. Na Faculdade de Ciências e Tecnologia, onde se encontram os cursos de engenharia, a adesão à greve, no período da manhã, de docentes e funcionários não docentes foi de 20, 97 por cento. Também no Pólo III, dedicado à área da saúde, os maiores prejuízos sentem-se na cantina. Depois das aulas, as alunas de medicina de 18 anos, Daniela Sanches e Catarina Silva, põem-se na fila. À frente têm cerca de 55 pessoas, menos do que habitual. E à disposição têm apenas o “prato social” – a ementa mais barata -, uma vez que o bar e o snack (mais caro e com mais pratos) estão encerrados.

“Só na cantina é que se nota a greve… Eu tive todas as aulas teóricas da manhã”, diz Anaísa Bartolomeu, estudante de Ciências Farmacêuticas, enquanto aguarda vez para tirar fotocópias na biblioteca.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

"Bolseiros, investigadores, professores e estudantes em greve!"

Copiado integralmente do Vias de Facto, de um post do Zé Neves (sublinhado meu). (Não tenho tempo para mais, mas queria anunciar a Greve Geral, pois razões não nos faltam!)

A greve geral do próximo dia 24 de Novembro é um momento privilegiado para questionar as respostas políticas, manifestamente desequilibradas, a um quadro económico de crise. Mas a greve pode assinalar também uma insatisfação mais difusa, prolongada, que atinge a relação das pessoas com o seu trabalho, mas que cada vez mais invade outras dimensões do quotidiano. A imposição de uma austeridade assimétrica, que protege os mais fortes, restringe progressivamente a autonomia pessoal e a possibilidade de escolha, corrói as capacidades de definir projectos de vida individuais e colectivos, destrói direitos que constituem a base elementar de uma sociedade minimamente justa.

É indiscutível que em Portugal se tem vindo a fazer um esforço de investimento na ciência. Todas as pessoas envolvidas na criação científica não deixam, no entanto, de ser afectadas por dinâmicas sociais mais alargadas que, atingido a maioria da população, se traduzem na erosão progressiva de direitos e na imposição de lógicas de organização de trabalho que assentam numa progressiva precariedade. Tal paradigma, sempre apresentado como uma inevitabilidade, constitui uma forte ameaça à autonomia do conhecimento científico.

Etapa de uma resposta colectiva ao futuro de inevitabilidades que nos é proposto, a greve assinala também a visível necessidade de criar formas de debate que permitam pensar modos mais eficazes de enfrentar estes problemas. Por isso, dia 24 fazemos greve.

A declaração já ultrapassou as 400 assinaturas; assinem aqui e divulguem junto dos colegas.

"Praxes académicas: sim ou não?"

Publicamos, finalmente, os dois artigos de opinião publicados no número 3 da Improp, a revista da da associação de estudantes da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, com o tema das praxes. O primeiro foi escrito por João Luís Jesus, dux veteranorum e membro da Associação Académica de Coimbra. O segundo foi escrito por nós com base em alguma bibliografia.

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O que é a praxe académica, que significa?
Referindo-me sempre a praxe académica como a Praxe Académica Coimbrã, única e exclusivamente, esta é o aglutinar de todos os usos e costumes praticados ao longo das diversas gerações que pisaram as lajes e trilhos da Universidade de Coimbra. Representa todas
as vivências, as alegrias e as revoltas, os amores e os dissabores, o sucesso ou a raposa. A Praxe Académica Coimbrã não assenta numa postura redutora e simplista da interacção com os recém-chegados, na primeira semana de cada ano lectivo. Esta existe ao longo de toda a vida de qualquer académico, seja Caloiro ou Veterano; de Licenciatura, Mestrado, Doutoramento, ou de outros cursos de formação sem grau da UC. Engloba ainda estudantes do Ensino Secundário, discentes, docentes ou mesmo, Conimbricenses, sejam Praxístico ou contra. A Praxe Académica Coimbrã, no seu significado mais lato, é o Pulmão e o Coração do dia-a-dia Conimbricense.

A praxe é mesmo uma tradição académica?

Praxe vem do latim Praxis que significa prática. As tradições não passam de actos repetidamente praticados, e como estes são realizados em prol e no seio da Academia de Coimbra, praxe e tradição académica, neste caso, são sinónimos.

As tradições académicas fazem parte da cultura de um povo?
Tendo em conta a envolvência popular da Cidade de Coimbra em torno da Praxe Académica Coimbrã, ano após ano, a Praxe Académica Coimbrã constitui-se como um grande marco identitário de Coimbra, não querendo ser pretensão da nossa parte, em tal afirmação.

Faz sentido existir actualmente a praxe? Porque sim à praxe? O que se pretende com a praxe?
Toda e qualquer pessoa, acima de tudo, deve estar informada. E, reforço, bem informada. No entanto, essa busca de informação parte de cada pessoa enquanto parte integrada numa instituição académica como a nossa. O problema é que as gerações pós-conscrição cada vez mais estão habituadas a seguir o map da sua vida, indicado por um qualquer pseudo-burocrata. A Praxe Académica Coimbrã e o Magnum Concilium Veteranorum, através do Código da Praxe da Universidade de Coimbra, não procuram indicar qual o caminho exacto a tomar, mas sim, balizar os limites do bom senso e da sociabilidade académica numa comunidade de milhares de almas e individualidades diferentes.

Não existe maldade e humilhação na praxe?
Existe em quem a pratica mas não se encontra englobada no Código da Praxe da Universidade de Coimbra, sendo que nesses casos o Magnum Concilium Veteranorum não compactua com tais actos. Os limites da prática praxística – perdão pelo pleonasmo – dão uma liberdade individual que permite que a mesma tenha diversas conotações, conforme o caso, o lugar e o momento. Em qualquer situação que o Magnum Concilium Veteranorum seja interpelado, por se suspeitar a ocorrência de excessos, este intervêm rígida e determinantemente, através da sua base codicísta.
Facto é que a Praxe Académica Coimbrã permite a quem fizer uso dela, poder argumentar de forma tão irrefutável que nem o seu interlocutor, por total ignorância da praxe, preguiça de espírito ou conformidade lasciva, perceba os erros do colega, perpetuando, assim, um estado de
espírito anárquico contra-producente.

A praxe continua a ter o mesmo significado e o mesmo objectivo que há 40/50 anos atrás?

A Praxe Académica Coimbrã até 1979/80 esteve sempre em estreita relação e conotação com a irreverência e envolvência política na história do Portugal contemporâneo. Foi a partir dessa altura que se perfilaram outras estruturas, desta vez, democráticas, amplamente representativas da Academia de Coimbra e gradualmente imparciais dos poderes da Capital. Neste sentido, o Magnum Concilium Veteranorum debruçou-se sobre o seu verdadeiro papel, o da regência da identidade praxística coimbrã. Como tal, a Praxe Académica Coimbrã não pretende afirmar-se dentro de qualquer segmento da política partidária actual portuguesa, pelo contrário, defende o livre pensamento e escolha.

Pode um aluno recusar a praxe, que lhe acontece?
Pode, se assim for a sua vontade. O que lhe pode acontecer? Nada. Cada um é livre de escolher o caminho da sua iluminação cognitiva, tendo o poder de decisão em relação a adesão ou não da praxe mediante aquilo que lhe é proposto. Todo e qualquer aluno que sinta a sua integridade física ou psicológica posta em causa, em qualquer momento da praxe, é livre de a recusar e de a abandonar se assim for o seu desejo, sem que por isso tenha de se declarar contra a praxe. Todo e qualquer aluno, pertencente à Universidade de Coimbra, possui o livre arbítrio de aderir ou não ao espírito académico na qual se baseia a prática praxística sem qualquer represália sobre a sua decisão. No entanto, a postura assumida pelo estudante deve ser coerente ao longo do seu percurso académico.

O que pensam do MATA?
Desde de 1974, Portugal vive em democracia, como tal, todos têm direito a exprimir as suas opiniões livremente. O MATA é um grupo de pessoas que defende uma opinião e como tal deve ser respeitado, assim como aqueles que defendem posições com outra orientação.

Cum bona gratia Dux Veteranorum dimittere
João Luís Jesus
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O que é a praxe académica, que significa?
A praxe académica, no sentido estrito entendida como o conjunto de actividades que os veteranos impõem aos caloiros durante o início do ano lectivo, tem todas as características de um ritual de passagem. Deste modo, a praxe representa uma elevação (apenas aparente) do
estatuto social, onde nos deparamos com um processo de nivelamento, uniformização, rebaixamento, onde os caloiros assumem um papel de submissão perante o papel de domínio interpretado pelos veteranos. Não havendo regras bem definidas, nem sendo claro o programa de actividades desse período, observa-se de tudo na praxe, desde o mais lúdico ao mais humilhante. A provação iniciática, comum, partilhada e dolorosa, contribui para o fortalecimento das relações interpessoais e para a perenidade dessas “ligações” criando a sensação de integração e de pertença a um grupo.
Num conceito mais lato, a praxe académica é toda a panóplia de práticas rituais, formais e festivas, acompanhadas por uma constelação de imagens, de objectos e de mitos, associada aos estudantes universitários. No entanto, a praxe académica representa apenas uma parte da vida de um estudante universitário, podendo este ter uma actividade cultural, recreativa, desportiva e intelectual completamente dissociada daquela.

A praxe é mesmo uma tradição académica?
O que se observa na maioria das universidades do país não é mais do que uma tradição inventada, ou seja, muitas das práticas que são tidas por antigas são recentes na sua origem e muitas vezes inventadas. Isto é, muitas dessas práticas, tendo tido existência real no passado, são muito tempo depois resgatadas para contextos muito díspares daqueles que as viram nascer. Quer isto dizer que o que designamos no presente de tradição é menos o que nos chegou do passado mas mais o que escolhemos do passado para lhe dar continuidade. O resgatar desses hábitos antigos serviu apenas para determinadas universidades, recentes e sem história, principalmente universidades privadas, construírem e afirmarem uma identidade universitária e, assim, alimentar o sentimento corporativo de superioridade das elites – principalmente quando estas são recrutadas entre aqueles que não lhes pertencem pelo nascimento ou imputação.

As tradições académicas fazem parte da cultura de um povo?
Se se quiser e fizer por isso – fazem parte; se não se quiser – deixam de fazer. Por princípio opomo-nos a qualquer cultura de estagnação, ou seja, a qualquer cultura de massas. A desconfiança a respeito da cultura de massas repousa fundamentalmente em três receios:
1. que ela reduza os seres humanos ao estado de massas e entrave a estruturação de indivíduos emancipados, capazes de discernir e de decidir livremente;
2. que ela substitua, no espírito dos cidadãos, a legítima aspiração à autonomia e à tomada de consciência por um conformismo e uma passividade perigosamente regressivas;
3. que ela propague, por fim, a ideia de que os homens desejem ser fascinados, desviados e enganados na esperança confusa de que uma espécie de satisfação hipnótica os fará esquecer, por um instante, o mundo absurdo, cruel e trágico onde vivem.

Faz sentido existir actualmente a praxe?
Faz sentido como reflexo da própria sociedade, uma sociedade decadente e em declínio. Não faz sentido, se o que se pretender for reverter esse processo.

Porque não à praxe?
Porque há outras formas, como sempre houve, de conhecer pessoas, de entrar e conhecer novos lugares, de participar na vida colectiva, de nos relacionarmos uns com os outros (mais ou menos semelhantes a nós), e por todas as outras razões.

Como e porquê surgiu o MATA?
O MATA surge no início da década de 90 na FCSH-UNL, num contexto de grandes contradições. Em 1992, Cavaco Silva implementa a Lei das Propinas, embora com uma forte contestação. Alguns anos antes, e num curto período, aparece um enorme número de novas universidades, muitas delas privadas. Este boom é acompanhado pelo ressurgimento das praxes e outras tradições académicas – depois de abolidas em Coimbra em 69.
Nesta altura o MATA era pouco mais que uma sigla para chatear, reproduzida por gente que lutava contra as propinas e se irritava com o avanço conservador nas faculdades. As praxes e a sua miríade de discriminações associadas, o conservadorismo, o elitismo, com ou sem propinas, estavam aí à espera de ser combatidos.

Estão ligados a algum partido ou movimento político?
A resposta é obviamente não, pois um assunto como este não é propriedade ideológica de qualquer partido. Seria tão absurdo como perguntar se determinada comissão de praxe ou conselho de veteranos está associada a algum partido. De qualquer das formas, achamos que está no direito de qualquer pessoa militar no partido que entender.

Como dão a conhecer as vossas ideias, quais são as vossas acções?

Em vez de organizar praxes preferimos organizar actividades em que todos se sintam iguais com as suas diferenças e onde possamos criar objectos que reforcem o nosso desejo de mudar as nossas formas de estudar, de nos divertir e de viver. Partindo dessa vontade, o MATA já criou, colou e distribuiu centenas de cartazes e panfletos e pintou dezenas de murais, já organizou vários debates e duas festas, editou oito Toupeiras – o jornal do movimento –, um vídeo e o CD “Não resistir só e não só resistir”, que junta as músicas de várias bandas pouco tradicionais que continuam a não querer acomodar-se.

São contra as tradições académicas em geral ou apenas a praxe?
O Movimento Anti “Tradição Académica” opõe-se a toda a actividade estudantil que se proponha como tradição académica com o intuito de assim se legitimar perante os outros e de assim se fazer perpetuar. Opomo-nos à ideia de que os estudantes universitários se vestem de uma única maneira, tocam um único estilo musical e são um grupo intrinsecamente distinto de todas as outras pessoas que frequentam uma universidade ou uma cidade.

Apesar da vossa posição acham que poderá haver coisas boas na praxe?

De todas as experiências humanas podem sair coisas boas, desde que se faça por isso. A praxe não é excepção. No entanto, não é por isso que se deve defender a praxe.

MATA

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Notícias sobre a manifestação

Publicamos 3 notícias sobre a manifestação de 4ª feira passada, com alguns sublinhados nossos.

Milhares de estudantes concentrados frente ao parlamento
Sol

De acordo com o presidente da Associação Académica de Coimbra (AAC), entre seis e sete mil estudantes do ensino superior concentraram-se em frente à Assembleia da República, na esperança de serem ser recebidos pelos grupos parlamentares e pelo presidente do Parlamento a quem solicitaram audiências.
Durante a manifestação de estudantes, hoje em Lisboa, Miguel Portugal declarou que «para não voltarmos a passar por este tipo de crises, pensamos que deve haver um investimento notório no ensino superior de modo a que haja pessoas mais qualificadas».
O presidente da AAC afirmou ainda que o ensino superior «não é um custo, mas sim um investimento», alertando para a eventualidade de alunos abandonarem os estudos por falta de apoios.
O dirigente estudantil criticou o decreto-lei 70/2010, que altera a forma de cálculo da capitação dos agregados familiares, diploma que os estudantes pretendem ver revogado. Referindo-se a eventuais cortes na acção social escolar, considerou que «é muitíssimo injusto» porque «a poupança não tem de ser feita à custa dos mais carenciados».
O protesto foi convocado pela Associação Académica de Coimbra, mas conta com a presença de estudantes dos politécnicos de Tomar e Beja, das universidades do Porto e Minho e da Faculdade de Ciências de Lisboa, entre outras.
A manifestação ficou marcada pela divisão entre os estudantes.
O presidente da Associação Académica da Universidade de Lisboa, André Caldas, esclareceu que esta estrutura não se juntou à manifestação por o protesto ter sido rejeitado no último encontro nacional de direcções associativas, «não podendo ter pretensões a ser uma manifestação nacional».
Também a Associação dos Estudantes do Instituto Superior Técnico, em Lisboa, revelou que não participa na manifestação «por considerar que os motivos pelos quais foi convocada - o corte nas bolsas de estudo, a iminência de milhares de estudantes saírem do sistema de acção social e, consequentemente, do ensino superior - não se aplicam à realidade actual».

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Ensino Superior: Estudantes fazem balanço positivo da manifestação de hoje e negativo do estado do sector
Público

O presidente da Associação Académica de Coimbra (AAC) fez hoje um balanço “positivo” da manifestação realizada em Lisboa, pela mobilização dos alunos, mas também “muito negativo”, devido aos problemas “muito graves” que o ensino superior atravessa.
A manifestação do ensino superior público, para contestar os cortes na Ação Social Escolar e o aumento das propinas, entre outros, reuniu hoje entre seis mil e sete mil alunos de várias universidades do país, segundo a organização, e cerca de cinco mil, de acordo com a PSP.
“O balanço que fazemos é positivo e negativo. Positivo porque houve muita mobilização e negativo porque essa mobilização significa que há problemas muito graves em relação ao ensino superior”, afirmou o presidente da AAC, que convocou o protesto.
Os estudantes concentraram-se no Marquês de Pombal e seguiram depois para a Assembleia da República, onde foram recebidos pelos partidos com assento parlamentar.
Segundo Miguel Portugal, os grupos parlamentares “mostraram alguma abertura” para discutir a questão das bolsas de Acção Social, cuja atribuição deverá ser afectada pelo impacto do decreto-lei 70/2010, relativo ao cálculo da condição de recursos dos agregados familiares, que os estudantes querem ver revogado.
“Os objectivos políticos foram também cumpridos, mas se a situação continuar temos a certeza que mais estudantes virão para a rua protestar”, sublinhou o presidente da AAC.
Relativamente aos estudantes da Universidade de Coimbra, Miguel Portugal estima que dos cerca de cinco mil atuais bolseiros “entre 1200 a 1500” vão deixar de receber apoio.
Quando os estudantes ainda se encontravam no Marquês de Pombal receberam o apoio do candidato presidencial Manuel Alegre, apoiado por PS e BE, uma presença que surpreendeu o presidente da ACC.
“Foi uma presença importante para mostrar que é uma luta responsável”, comentou.
Participaram no protesto alunos das Universidades de Coimbra, do Minho, Porto e Nova de Lisboa, das Faculdades de Belas Artes e Ciências da Universidade de Lisboa e dos Institutos Politécnicos de Beja e Tomar, entre outras instituições.

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Ensino Superior: centenas de estudantes protestam em Lisboa
TVI

Mais de 300 alunos do ensino superior público estão a manifestar-se no Marquês de Pombal, em Lisboa, contra os cortes na acção social escolar, o aumento do valor das propinas e o processo de Bolonha.
«Ensino público gratuito de qualidade para todos», «Por mais acção social escolar», «Nunca pagámos tanto por tão pouco» e «Mais financiamento para o ensino superior» são algumas das frases que podem ser lidas nos cartazes empunhados pelos estudantes.
O protesto foi convocado pela Associação Académica de Coimbra, mas conta com a presença de estudantes dos politécnicos de Tomar e Beja e das universidades de Lisboa, Porto e Minho, entre outras.
«É uma situação que toca a todos e que está a ficar cada vez mais grave. A acção social chega tarde e a más horas e as propinas aumentam cada vez mais», afirmou à agência Lusa João Guerra, do Instituto Politécnico de Beja.
A manifestação vai depois seguir para a Assembleia da República, onde os estudantes esperam ser recebidos pelos grupos parlamentares e pelo presidente Jaime Gama, a quem solicitaram audiências.
Cláudio Domingos, do Instituto Politécnico de Tomar, pede ao ministro do Ensino Superior, Mariano Gago, para «não se esquecer dos estudantes» e questiona «como se sobrevive com 97,5 euros por mês de bolsa», numa crítica aos atrasos no acerto destes apoios.
No local da concentração, no Marquês de Pombal, ainda não se encontram os alunos da Universidade de Coimbra, sendo esperados 3500 estudantes desta instituição.
O desfile até ao Parlamento vai obrigar ao corte do trânsito na Rua Braacamp, Largo do Rato e Rua de São Bento.

É a "praxe", dizem eles

Publica-se o seguinte artigo de opinião encontrado aqui, site do Jornal de Notícias, a 19 de Novembro de 2010. O autor é Manuel António Pina, jornalista e escritor português.


É a "praxe", dizem eles


Com o cair da folha e o início do ano lectivo, começam a ver-se por aí, onde existam universidades e aparentados, os habituais espectáculos de bandos de imberbes caloiros apascentados por não menos imberbes "doutores" ministrando-lhes todo o tipo de boçalidades e indignidades que a rasca imaginação lhes permite, com o devido enquadramento de bebedeiras, comas alcoólicos e música pimba que ilustram o nível moral e intelectual não só dos futuros caixas de supermercado da Nação mas igualmente das escolas que os formam.


Pôr jovens estudantes de joelhos e obrigá-los a suportar com um sorriso nos lábios as prepotências fascistas, nem sempre "soft", dos mais velhos é, alega-se da parte dos por assim dizer responsáveis de algumas universidades, uma forma de "integrar" os alunos recém-chegados na vida e no espírito universitários. E, Deus nos valha, se calhar é. Não restem dúvidas de que, de tal ponto de vista, as universidades cumprem até à excelência a missão que, de há uns tempos para cá, alegremente pretendem assumir, não de lugares de estudo e investigação, mas de fornecedores de mão-de-obra qualificada (na circunstância em despotismo e docilidade acrítica) ao mundo empresarial e do trabalho.


Ontem vi, nos "Leões", uma rapariga de pés e mãos no chão cavalgada por um futuro "doutor à bolonhesa" que simulava chicoteá-la. Que melhor imagem da Universidade (ou de alguma Universidade) que temos?

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Manifestação Ensino Superior, 17 Novembro, às 15h. Cidade Universitária -> MCTES

A manifestação está marcada para Lisboa e é já amanhã mas, tanto no site da Associação Académica de Lisboa (AAL), como no da Associação Académica da Universidade de Lisboa (AAUL), ou da Associação de Estudantes da Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT-UNL), ou o da AE do Instituto Superior de Agronomia (ISA-UTL), ou a AE do Instituto Superior Técnico (IST-UTL), ou da AE da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH-UNL), ou da AE da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), ou da AE Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (AEFLUL), não se encontra referência a esta. Que se passará?
Uns, encontramo-los quase vazios, outros com publicidade a eventos organizados por marcas de telemóveis, outros falam de aniversários institucionais, outros pedem desculpa por o website estar temporariamente indisponível.
É preciso ir ao site da Associação Académica de Coimbra para se saber da convocatória, que se transcreve abaixo.
Percebe-se, por aqui, que foi organizada e algumas daquelas organizações estudantis aderiram. Mas porquê tão mal informação. Não vi cartazes nas ruas, os sites não anunciam, as televisões, rádios e jornais, claro que também não (talvez apareçam no dia para tirar umas fotos e filmar uns segunditos). Há panfletos a circular? Parece que houve algumas reuniões gerais de alunos mas que aconteceu depois disso? Não querem o sucesso da manif?
O comunicado (oficial?) do evento lá o encontrei:

“MARCHA PELO ENSINO SUPERIOR”
A degradação do Ensino Superior é hoje uma realidade incontornável. Devido a uma política de desinvestimento sucessivo por parte do Governo, as Faculdades sofrem uma crise de financiamento sendo que as propinas dos estudantes servem meramente para despesas de funcionamento, ao contrário do que a Lei prevê. Temos serviços a funcionar a meio gás, cantinas e bibliotecas encerradas para poupar recursos; um parque escolar degradado, não só ao nível do conforto e da higiene, mas constituindo já um perigo real para os estudantes que o utilizam; e um sistema de acção social que não abrange todos os que dele necessitam e que mantém o modelo de atribuição de bolsas por escalões, promovendo a iniquidade.
E é esta a realidade que os estudantes muitas vezes ignoram. A organização das Universidades imposta pelo RJIES resultou num efectivo afastamento dos estudantes da gestão das Faculdades que leva a um igual distanciamento dos seus problemas. Os estudantes estão a ser transformados em meros utentes, retirando-lhes o papel de elemento essencial no funcionamento das Universidades.
A crise de representatividade que assola o nosso país tem que ser combatida e para isso é necessário que todos tomem consciência, primeiro do modo de funcionamento das instituições em que estão inseridos e, segundo, dos problemas específicos que as afectam. Cabe aos estudantes do Ensino Superior especial responsabilidade, na medida em que sempre foi nas Universidades que se pensou o futuro. Não mais podemos continuar inertes e amorfos como até agora.
Optámos nos últimos anos por soluções de diálogo sem que houvesse a mínima abertura por parte do Ministério, está na hora de fazer mais. A manutenção de Mariano Gago como titular da pasta do Ensino Superior é uma afronta para todos nós que temos mantido as iniciativas políticas dentro das Universidades. O programa de Governo não acarreta qualquer esperança ao quase ignorar os principais problemas da Universidade Pública. Está na hora de fazermos mais e de mostrarmos que discordamos com esta forma unilateral de impor políticas educativas.
Apelamos, por isso, aos estudantes da UL que se juntem a nós numa acção de rua que visa alertar para os principais problemas do Ensino Superior, salientando aquilo que queremos que seja feito. Seguindo o lema “Não somos contra, somos por um Ensino Superior de Qualidade” pretendemos marcar a diferença para com o mero protesto e fazer uma Marcha pelo Ensino Superior que aponte soluções concretas para os problemas que detectamos. Terça-feira, dia 17 de Novembro marcharemos desde a Cidade Universitária até ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior para entregarmos as nossas propostas a quem tem a obrigação de fazer melhor."


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A crise que o país atravessa vai ter repercussões gravíssimas na economia das famílias. É de esperar, em consequência, um aumento de situações de carência económica num significativo e crescente número de alunos. Em face disto, teria sido oportuno que o Ministério do Ensino Superior tivesse tido em consideração as nossas sugestões relativas aos limiares de elegibilidade para o direito às Bolsas de Estudo. Mas não foi isso que sucedeu por total insensibilidade social e falta de visão política do Governo. O que está preconizado é um limiar extremamente baixo, que não tem em conta as reais exigências financeiras de frequência do Ensino Superior Público.
No futuro, estudar vai ser ainda mais exigente em termos financeiros. E vai sê-lo em especial para aqueles que menos recursos possuem. Caminhamos em direcção ao elitismo no acesso e frequência do Ensino Superior Público.
Muitos de nós iremos ter que, obrigatoriamente, abandonar os estudos, por deixarmos de ter possibilidades para tal. É uma realidade que nos entristece e que nos faz temer pelo nosso futuro.
Dia 17 de Novembro, em Lisboa, a Associação Académica de Coimbra vai, juntamente com outras Associações Estudantis de Ensino Superior, manifestar-se contra o corte nas bolsas de estudo. Queremos que a nossa representatividade em Lisboa atinja os 5 mil estudantes.
A partida está marcada para as 10H00, do Largo D. Dinis.
Teremos partidas em simultâneo do Pólo 2 e do Pólo 3.
Este é um desafio que queremos vencer. Apelamos à solidariedade de todos os estudantes, mesmo daqueles que não vão ser afectados pelas medidas do Governo. Só assim nossa voz terá força. Esta é uma missão de entreajuda entre todos os estudantes e de defesa do Sistema Público de Educação.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Já sabemos: quem não vive a praxe não sabe o que ela é.

A praxe é um mundo obscuro e distante escondido dos olhares de todos. Poucos são os que se conhecem que tiveram oportunidade de vislumbrar um acontecimento destes. A praxe é secreta e ninguém sabe o que é. Muitas vezes nem os próprios que praxam, e que por vezes "abusam" e portanto não praxam. "Abusam, não praxam", repetem-nos da sua torre de marfim. Os seus códigos bem definidos são apenas perceptíveis por algumas dessas almas geniais, todos os outros são hereges e incapazes de compreender seja o que for sobre este tema.
Enfim fica mais uma notícia. Desta vez do Jornal de Notícias.

foto: Lisa Soares/global imagens
É o barulho ensurdecedor que caracteriza um cortejo em que não há sinais de crítica nem de contestação.

Mar de caloiros a ribombar pela Baixa fora

Rituais de integração, assim entendem os apaniguados da praxe académica, os que nestas coisas participam, fenómenos como o cortejo da latada, que ontem à tarde tomou conta da Baixa portuense.

Com os céus a fazerem tréguas e o Sol quase invernal a mostrar-se, era em terra que trovejavam latas, tambores, bidões, buzinas e vozes esganiçadas dos alunos de primeiro ano, orientados por aqueles que, com o emagrecimento curricular de Bolonha, têm já ares doutorais ao fim de dois anos.

Cerca de dez mil estudantes, enquadrados à margem das ruas pela pequena multidão de familiares e curiosos que se junta nestes momentos (bem menos do que nos cortejos da Queima das Fitas), fizeram barulho, barulho e mais barulho.

As latas de bebidas, muitas pintadas com as cores dos cursos, muitas outras ostentando as marcas de refrigerantes ou de cervejas, são o ingrediente primordial, produzindo tal algazarra que até os dizeres dos caloiros, enaltecendo as respectivas escolas, se tornam praticamente indecifráveis.

Juntam-se-lhes outros artefactos, dos tradicionais tachos e panelas às modernas sirenes eléctricas montadas em carrinhos de compras de supermercado.

Com a novidade de as latas que ficavam pelo chão serem recolhidas (por caloiros, claro), para evitar o tradicional rasto caótico, os estudantes desceram dos "Leões" até à Praça da Liberdade, subindo a Avenida dos Aliados até junto dos Paços do Concelho, onde prestaram juramento, e regressaram à origem.

Nesta ocasião, por comparação com o que se passa na Queima, há muito menos euforia etilizada, embora se rasteje muito mais pelo chão. Só alguns dos ditos "doutores", trajando capa e batina e empunhando colheres de pau ou mocas de Rio Maior, procediam ao exercício do levantamento do copo de cerveja.

Entre os caloiros que alinham na praxe, é unânime a importância de que este ritual se reveste. É a semana deles, numa forma que jamais será repetida, é a celebração das novas amizades que se criam, muitas das quais perdurarão pela vida fora, é o processo de integração numa realidade que, embora efémera, lhes parece agora a coisa mais importante do mundo.

O mesmo entre os que já estão mais avançados nos estudos. No passeio da Rua dos Clérigos, uma estudante era chamada para a fotografia por amigos que estavam no cortejo, com os tais símbolos de autoridade de madeira feitos. E não queria: "Ai, não acredito! Eu estou 'destrajada', não me tragas para aqui".

"Destrajados" ou não, muitas vezes destravados, destramam tudo o que possa obstar aos alegres relacionamentos e à integração. Pelo menos, julgam que sim.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Maravilhoso para mostrar o discurso de tom intimidatório e o carácter obrigatório e não-agradável da praxe

Directamente do blogue da Comissão de praxe do curso de administração pública da Universidade do Minho encontrámos isto que a seguir se transcreve:

Praxes Semana de 15 a 19 de Novembro
Caloiros,

Como estiveram 3 SEMANAS sem ter praxe, vimos informá-los que esta semana que vem vão ter praxe todos os dias inclusive na Sexta-Feira.

Isto porque já não têm que estudar e não admitimos qualquer tipo de desculpa. Estão já avisados que quem não for à praxe esta semana as consequências não vão ser as melhores, porque os doutores esforçam-se por vocês e vocês são uns ingratos, por isso que ninguém falte, estão avisados.

A praxe começa segunda feira às 8.59h no Prometeu e vamos passar lista de presenças, ficam já a saber, por isso quem for este fim de semana a casa que esteja cá na segunda feira de manha.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Dois textos, uma opinião


De volta ao UELine, site da Universidade de Évora, no seu espaço onde diversos membros da Universidade expressam a sua opinião sobre a praxe, reproduzo dois textos da Professora Sara Marques Pereira do Departamento de Pedagogia e Educação:

Afinal Darwin estava errado De novo, nestas três décadas, assistimos a deploráveis actos de praxe um pouco por toda a UniverCidade. Alunos mais velhos, que pelo simples facto de o serem, se sentem no inexorável direito de vexar os mais novos nas formas menos higiénicas e até pouco imaginosas. Muitos destes actos provocam a compreensível indignação na Academia, que devendo ser um espaço de cidadania, se transforma nos meses outonais, por motivo das praxes, nesta carnavalização de não-cidadania. Dos alunos mais novos nada digo, mesmo daqueles que suposta e alegremente se compadecem nesses rituais de integração - os denominados "bichos". Mas dos mais velhos, esses sim, pois, contrariando os princípios darwinianos, parece que não evoluíram quando passaram de "bichos" para outra escala.

Negros Hábitos ou a Praxe da Praxe
Abriu a caça ao caloiro, começaram as faltas às aulas e as acções de humilhação e prepotência colectiva perpetradas por alguns alunos de negras capas - É a estação das praxes. É para mim uma estação cinzenta, quando não negra, que chega por esta altura.
Devo dizer que fico sempre revoltada quando vejo estas manifestações pela rua e pelos espaços da universidade. Porque que é que se foi buscar o que há de pior na instituição militar? Porque não se acolhem os alunos como deve ser? Quem vem de novo tem tanto para conhecer, nesta cidade tão fantástica para estudar e viver. Precisa que lhe ensinem os sítios dos sítios, que lhe expliquem como funciona a casa, enfim, como se pode divertir e trabalhar.
Os caloiros são tipicamente alunos muito jovens, muitas vezes nunca estiveram fora de casa e se vêm confrontados com estas violências. Para os mais velhos, os que praxam, eles, caloiros, têm de passar por isso porque é uma forma de integração, ou de iniciação, porque eles também já passaram. É então uma forma de vingança? Para a vida escolar o descalabro não é menor, são aulas adiadas, alunos que faltam, e por aí adiante. Praxados são também os professores.
Desculpem os supostos defensores da tradição académica, mas isto não tem nada de tradição e muito menos de académica, tem é muito de negros hábitos, expondo o que o ser humano tem de pior nas situações em que se sente com poder sobre os outros.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

«É preciso fazer alguma coisa»

Publicamos integralmente a opinião do Professor João Boavida*, encontrada na versão on-line do Diário As Beiras aqui, no dia 2 de Novembro.

Por acaso coincidiram, em poucos dias, em jornais de Coimbra ou da Academia, vários trabalhos onde o denominador comum é a praxe, as festas académicas e aquilo em que estão a cair. Afinal já muita gente começou a verificar que as coisas não estão bem. O problema não é só de Coimbra, mas esta academia tem especiais responsabilidades, não só porque foi ela que começou mas também porque encarna, no imaginário nacional, a própria ideia de universidade e de estudante, e isso pesa muito. A tradição – que nem sempre se recomendou – não pode, apesar disso, estar nas mãos de uns tantos que, acabados de chegar e já de partida, imberbes facial e intelectualmente, vêm aqui fazer o seu desmame mediante comportamentos inaceitáveis sob a capa protetora da impunidade praxística.

O problema não se resolve proibindo as ditas cenas – o que terá que acontecer se as coisas continuarem a descer deste modo. Mas não será a melhor maneira, porque não faltariam saudosistas a ficar cegos, mesmo face aos mais condenáveis praxismos, e logo viriam os demagogos do costume a gritar contra a repressão – assim farão até a anti-repressão se transformar em repressão e lhes cair em cima, além disso os políticos de terceira não deixariam de meter o bedelho, para aproveitar, etc.

Ouvindo, na Sé Nova, há dias, excertos do Messias, de Händel, pela Orquestra Clássica do Centro e pelo Orfeão Académico de Coimbra, não pude deixar de pensar nas distâncias que podem separar manifestações de uma mesma cultura – neste caso a chamada cultura coimbrã – e no muito que ela pode fazer para puxar pelo nível geral da academia, e nem sempre faz. Com efeito, a receção ao caloiro podia ser uma excelente ocasião para a Universidade de Coimbra, e a cidade, mostrarem a sua excelência, ou, pelo menos, os muitos furos que estão acima da média portuguesa e fazer disso factor educativo e distintivo. Muitos estudantes, talvez a maioria, entram e saem com grande desconhecimento de tudo o que diz respeito à Universidade e à cidade. Têm uma ideia elementar da sua história, do seu património monumental e simbólico, passam de raspão pelas múltiplas actividades da Associação Académica e muitas vezes, em termos culturais, saem tão pobres como entraram. Por outro lado, para os acabados de chegar, sabendo do estado de indigência cultural de muitos, era uma boa oportunidade para criar formas de receção que os despertassem culturalmente. Mediante concertos, visitas guiadas aos monumentos, conferências, representações teatrais, em sala ou ao ar livre, festas variadas, enfim, modalidades múltiplas – já inventadas e a inventar – de contacto com a Universidade e a cidade e na base dos seus melhores trunfos. Seria uma boa oportunidade de os iniciar na vida académica e no espírito universitário que, apesar dos setecentos e tal anos que tem dentro de si, está ainda em formação.

Perante a beleza da interpretação conjunta da Orquestra, (com nove anos) e do Órfão Académico (com cento e trinta) percebemos como Coimbra e a Universidade se vão conservando e renovando, apesar de tudo. Depois, considerando, neste quadro inspirador, as actuais formas de receção aos caloiros, percebemos que algo deverá ser feito. A Associação Académica precisa de abandonar os discursos gastos e as campanhas débeis e sem chama, e perceber que lhe compete ver mais largo e mais alto. Tem pela frente um trabalho muito mais estimulante, rico, valioso e útil: organizar e promover formas de inserção e receção aos caloiros que os valorizem e os tornem exigentes para o resto da vida, porque exemplos de degradação, temos muitos. A partir daqui ela própria se revalorizará. É de uma revolução cultural que se trata. Só a Associação Académica de Coimbra, pela sua idade, nome e pergaminhos, está à altura de a iniciar.

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*Professor catedrático da Universidade de Coimbra. Licenciatura em Filosofia, em 1968, com uma tese sobre a Infinidade e Curso de Ciências Pedagógicas, ambos pela Faculdade de Letras de Coimbra. Foi professor do liceu e fez o estágio pedagógico. Foi então que se apercebeu da problemática do ensino da Filosofia e fez do tema uma das suas áreas de investigação e estudo. Especializou-se em Psicopedagogia pela Universidade Católica de Lovaina e doutorou-se em Ciências da Educação na Universidade de Coimbra, onde fez também provas de Agregação em Filosofia da Educação.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

EVENTO: Ciclo de debates PRIVADO, PÚBLICO e COMUM

Anunciamos um evento que nos parece ser do interesse da Universidade e de quem a vive:

Organizado pelo Teatro Maria Matos e pela UNIPOP
# entrada livre #
mais informações em http://u-ni-pop.blogspot.com.
local: TEATRO MARIA MATOS

 
Depois das quatro primeiras sessões («O que é o Comum», com Michael Hardt, «Economia, Comunismo e Pirataria», com José Maria Castro Caldas e Miguel Serras Pereira, «Cidades, Centros Comerciais e Praças Públicas», com João Pedro Nunes, Manuel Graça Dias e Miguel Silva Graça, e «Media, Propriedade e Liberdade», com Nuno Ramos de Almeida e Rui Pereira), o ciclo Privado, Público, Comum prossegue na próxima quarta-feira, dia 3 de Novembro, com o debate «Medicina, Ciência e Saberes», com António Fernando Cascais e Isabel do Carmo.
 

3 de Novembro | 18h30
Medicina, Ciência e Saberes
Conversa com António Fernando Cascais e Isabel do Carmo

Em tempo de guerra ou em tempo de paz, o sistema estatal de saúde constitui um dos elos mais importantes da relação entre os Estados e as populações e
durante a segunda metade do século XX os sistemas estatais de saúde têm sido considerados, na Europa mas não só, como uma das áreas primordiais de
intervenção estatal, entre outras coisas visando impedir que as desigualdades económicas entre pessoas e classes se reflictam de modo ainda mais marcante no direito universal à saúde. Durante o mesmo período, contudo, as relações entre médico e doente têm vindo a ser cada vez mais objecto de debate, no quadro do questionamento das lógicas de poder subjacentes ao conhecimento científico, daqui resultando importantes discussões acerca da importância do «atendimento» em meio hospitalar (questão particularmente valorizada por agentes privados do sector da saúde), por um lado, e, por outro, da necessidade dos sistemas públicos integrarem saberes e conhecimentos heterodoxos face às correntes dominantes na medicina (questão com implicações a nível nacional mas também no quadro dos debates em torno das valências de diferentes práticas culturais).

António Fernando Cascais é professor na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e Isabel do Carmo é médica no
Hospital de Santa Maria.


10 de Novembro | 18h30
Escola, Ordem e Emancipação
Conversa com António Avelãs e Jorge Ramos do Ó

A disputa pelo método de educar atravessa a história e é motivo de concórdia e discórdia entre professores, ministros, pais, psicólogos, alunos. Entre o
ensino público e o ensino privado, o primeiro financiado pelo Estado e o segundo suportado pelas famílias, têm-se travado muitos destes debates, que
se cruzam com outros tantos, à volta do ideal iluminista da educação como emancipação, e do seu potencial para corrigir as desigualdades ou, pelo
contrário, para as reproduzir. Entretanto, a disputa pelo método de educar coloca igualmente em campo professores e alunos. As relações de poder que
entre eles se estabelecem, das reiteradas críticas à falta de autoridade dos docentes à tentativa de levar a cabo experiências pedagógicas emancipatórias
da condição estudantil, têm suscitado um debate pouco informado, mas nem por isso menos acirrado, e que constitui o ponto de partida para esta conversa.

António Avelãs é professor e presidente do Sindicato de Professores da Grande Lisboa e Jorge Ramos do Ó é historiador e professor do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa.


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Introdução do Ciclo:

Há mais vida além do Estado e do mercado? Ao longo dos últimos anos, a oposição entre público e privado tem ocupado um lugar fundamental em grande
parte dos debates políticos e com a crise económico-financeira esta tendência acentuou-se de modo ainda mais nítido. Neste ciclo de debates, a UNIPOP propõe partir das contraposições entre público e privado e entre Estado e mercado, discutindo-as em diferentes dimensões do quotidiano, da organização do trabalho à construção das cidades, passando pelos processos educativos, pelo espaço mediático e pelas políticas de saúde. Procuraremos analisar as transformações das últimas décadas, tanto à escala nacional como à escala global, e apontar novos caminhos, num debate que vai além da simples contraposição entre público e privado ou Estado e mercado, contraposição cuja rigidez tende muitas vezes a confinar o combate aos processos de privatização à defesa do controlo estatal. Se por um lado queremos mapear claramente o que separa privado e público, por outro trata-se de questionar a possibilidade de questionar formas de poder transversais ao espaço público e à esfera privada.