José Couto Nogueira (n. 1945) foi fotógrafo de publicidade de imprensa, foi jornalista nas revistas brasileiras Interview, a Playboy e Vogue. Foi correspondente do jornal O Estado de São Paulo em Nova Iorque. Mais recentemente, em Portugal, trabalhou nas publicações Exame, DEmais , Ícon, Expresso, GQ e O Independente. Ler mais aqui.
A praxe é fixe?
i - por José Couto Nogueira, 21 de Novembro de 2009.
Pergunta
Caro José Couto Nogueira,
Escrevo-lhe simplesmente para auscultar a sua opinião sobre as praxes académicas. O meu filho, rapazola de quase 20 anos, frequenta o ensino superior. Em tertúlias, quando estendemos pontes geracionais, divergimos no na opinião sobre as praxes académicas. Para mim, são rituais exímios em declarações de desamor por uma caloirada imberbe, bobos de uma corte fútil, carente de bom senso. Ele contrapõe, aliando o conceito de tradição e pândega. A sujeição ao ridículo é justificada pela integração no clã? Eu não creio.
Atentamente,
Júlia Barros
Cara Júlia,
Em 1727, D. João V proibiu a praxe devido à morte de um aluno. Portanto já nessa época o tratamento alarve dos caloiros existia, era brutal e provocava reacção das autoridades. Durante séculos a praxe foi um exclusivo da Universidade de Coimbra, que também era a nossa única universidade, mas não alastrou ao Porto e a Lisboa quando estas cidades passaram a ter ensino superior. Houve períodos mais intensos mas nunca deixou de assustar, arreliar e humilhar os caloiros. A partir de 1834 torna-se mais violenta e as denúncias de excessos são constantes. Proibida em 1911 com a implantação da República, e suspensa em 1961 com o Luto Académico contra a repressão do Estado Novo, é praticamente abandonada no pós-25 de Abril. Quanto volta, no final da década de 1970, já é alargada a praticamente todas as universidades (assim como o traje académico de capa e batina, que sempre fora exclusivo de Coimbra) e depois chega ao ensino secundário. Devido aos inúmeros casos de violência, muitos causa de estragos físicos e psicológicos graves, é terminantemente proibida pelo ministro Mariano Gago em 2008 e 2009 ? prova de que continua a existir. Ainda recentemente houve um escândalo no Colégio Militar que, não se referindo à praxe da entrada na faculdade propriamente dita, tem a ver com as prepotências a que os alunos mais velhos se julgam no direito de exercer sobre os mais novos.
Pois é, a praxe sempre existiu, e vai continuar a existir. Tem a ver com os rituais de iniciação que persistem em muitas actividades e ambientes fechados. Há praxes nas forças armadas e até nos cursos de pilotagem ? quando o aluno "é largado", isto é, voa sozinho pela primeira vez, ao aterrar leva um valente banho de mangueira. Também tem a ver com a truculência própria da adolescência, a tal "integração no clã", e, presentemente, com um certo vazio de ideais que leva à procura de substitutos bastante estúpidos.
Os defensores falam em tradição, mas, como já aqui se observou a propósito de outras questões, a tradição é um argumento vazio. Há boas tradições, que é bom que se preservem, e há más tradições, que quanto mais cedo desaparecerem melhor. Por outro lado, uma praxe não tem necessariamente de ser violenta ou perigosa - mas é sempre desagradável e humilhante, e certas pessoas têm um menor grau de tolerância a serem sujeitas à vontade dos que podem só porque podem.
De um ponto de vista ético, é claro que não tem ponta por onde se lhe pegue. Não há qualquer mérito, vantagem ou valor em torturar e achincalhar os mais novos, mais fracos ou recém-chegados a um novo ciclo de estudos. Continua, por uma das razões que perpetuam a violência infantil: quem foi sujeito a ela sente prazer em desforrar-se quando chega a sua altura de estar na mó de cima.
Agora tente convencer o seu filho... Sujeite-o a uma praxe doméstica desagradável, a ver se ele percebe.
A praxe é fixe?
i - por José Couto Nogueira, 21 de Novembro de 2009.
Pergunta
Caro José Couto Nogueira,
Escrevo-lhe simplesmente para auscultar a sua opinião sobre as praxes académicas. O meu filho, rapazola de quase 20 anos, frequenta o ensino superior. Em tertúlias, quando estendemos pontes geracionais, divergimos no na opinião sobre as praxes académicas. Para mim, são rituais exímios em declarações de desamor por uma caloirada imberbe, bobos de uma corte fútil, carente de bom senso. Ele contrapõe, aliando o conceito de tradição e pândega. A sujeição ao ridículo é justificada pela integração no clã? Eu não creio.
Atentamente,
Júlia Barros
Cara Júlia,
Em 1727, D. João V proibiu a praxe devido à morte de um aluno. Portanto já nessa época o tratamento alarve dos caloiros existia, era brutal e provocava reacção das autoridades. Durante séculos a praxe foi um exclusivo da Universidade de Coimbra, que também era a nossa única universidade, mas não alastrou ao Porto e a Lisboa quando estas cidades passaram a ter ensino superior. Houve períodos mais intensos mas nunca deixou de assustar, arreliar e humilhar os caloiros. A partir de 1834 torna-se mais violenta e as denúncias de excessos são constantes. Proibida em 1911 com a implantação da República, e suspensa em 1961 com o Luto Académico contra a repressão do Estado Novo, é praticamente abandonada no pós-25 de Abril. Quanto volta, no final da década de 1970, já é alargada a praticamente todas as universidades (assim como o traje académico de capa e batina, que sempre fora exclusivo de Coimbra) e depois chega ao ensino secundário. Devido aos inúmeros casos de violência, muitos causa de estragos físicos e psicológicos graves, é terminantemente proibida pelo ministro Mariano Gago em 2008 e 2009 ? prova de que continua a existir. Ainda recentemente houve um escândalo no Colégio Militar que, não se referindo à praxe da entrada na faculdade propriamente dita, tem a ver com as prepotências a que os alunos mais velhos se julgam no direito de exercer sobre os mais novos.
Pois é, a praxe sempre existiu, e vai continuar a existir. Tem a ver com os rituais de iniciação que persistem em muitas actividades e ambientes fechados. Há praxes nas forças armadas e até nos cursos de pilotagem ? quando o aluno "é largado", isto é, voa sozinho pela primeira vez, ao aterrar leva um valente banho de mangueira. Também tem a ver com a truculência própria da adolescência, a tal "integração no clã", e, presentemente, com um certo vazio de ideais que leva à procura de substitutos bastante estúpidos.
Os defensores falam em tradição, mas, como já aqui se observou a propósito de outras questões, a tradição é um argumento vazio. Há boas tradições, que é bom que se preservem, e há más tradições, que quanto mais cedo desaparecerem melhor. Por outro lado, uma praxe não tem necessariamente de ser violenta ou perigosa - mas é sempre desagradável e humilhante, e certas pessoas têm um menor grau de tolerância a serem sujeitas à vontade dos que podem só porque podem.
De um ponto de vista ético, é claro que não tem ponta por onde se lhe pegue. Não há qualquer mérito, vantagem ou valor em torturar e achincalhar os mais novos, mais fracos ou recém-chegados a um novo ciclo de estudos. Continua, por uma das razões que perpetuam a violência infantil: quem foi sujeito a ela sente prazer em desforrar-se quando chega a sua altura de estar na mó de cima.
Agora tente convencer o seu filho... Sujeite-o a uma praxe doméstica desagradável, a ver se ele percebe.
4 comentários:
Pois, eu também faço um blog a falar mal dos anti-praxe e arranjo uns "ilustres desconhecidos" a cagar sentenças.
Esperem pelos dias 28 e 29 deste mês!
Antes os ilustres desconhecidos do que os cobardolas (não tão) anónimos quanto você que apenas fala fala, mas provavelmente não faz ponta de corno da vida que não seja vomitar algumas sentenças da boca para fora, sem eira nem beira nem ponta por onde se lhe pegue.
Quando começar a escrever algo com conteúdo e algum sentido, mesmo que contrário à opinião dos outros talvez consiga a atenção que tanto anseia.
Se os seus papás ainda não morreram talvez ainda vá a tempo de lhes pedir para ensinarem maneiras e até, quem sabe, princípios ;)
Queridos "anti-praxe":
Nao dariam um sentido mais útil à vossa vida, ocupando-vos de tarefas mais nobres do que dizer mal da praxe??
Eu pergunto-me como é que pessoas supostamente inteligentes confundem Praxe Académica Universitária com fenómenos de abuso (chamado bulling), nao sabem distinguir o boi da carroça?? Enfim...a mediocridade intelectual dá para isto. A Praxe é uma forma de educação e civismo, só porque em algumas Universidades a Praxe é basicamente dizer asneiras e beber até cair, nao quer dizer que seja esse o espírito sobre o qual foi criada. A voces "anti-praxe" que se arrogam duma superioridade moral e intelectual, leiam e pensem antes de dizerem e postarem barbaridades. Com os melhores cumprimentos
é incrível como é que é constante o comentário de que problema da praxe é de algumas universidades e não na minha, porque na minha pratica-se a "boa" praxe e os outros é que estragam tudo.
contudo rui, se quiseres fazer o favor de, na tua inferioridade intelectual e moral, explicares porque é que a praxe é o boi e o bulling a carroça (ou vice versa), gostaria de saber a tua opinão
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