De novo, via 5dias.net, um relato de Laura Dias.
Ontem, dia 14 de Dezembro, Itália, mas principalmente Roma nunca esteve tão bela!
Para os estudantes, professores e investigadores o dia começou cedo na capital. Pelas 10h30 da manhã estes juntaram-se na Piazza Aldo Moro, perto da Universitá Degli Studi di Roma “La Sapienza”, onde se iniciou o cortejo. Estavam presente pessoas de toda a Itália, de Génova a Nápoles. O percurso do cortejo pretendia dirigir-se para as imediações da câmara dos deputados, onde se votava a moção de censura ao Governo de Berlusconi. Pelo caminho, foram-se inserindo dentro de cortejo outros grupos como por exemplo a CGIL (CGTP italiana), a FIOM (Federazionem di Operai Metalurgici), grupos de defesa da água, cidadãos de L’Aquila ou simplesmente cidadãos descontentes com o que está a suceder em Itália, mostrando que apesar de terem motivos diferentes para lutar, o objectivo era o mesmo: demonstrar o descontentamento face ao governo corrupto. Chegando à Piazza Venezia, próxima da câmara dos deputados, assisti aos primeiros confrontos entre protestantes e polícias, visto que os manifestantes queriam tentar furar a barreira policial para se puderem fazer ouvir (literalmente) pelos deputados que se encontravam em discussão e que estavam “protegidos” dos protestos pelos bloqueios policiais.
Mais ao menos na mesma altura correu a informação de que a moção de censura tinha sido reprovada por três votos, circulando assim um sentimento de desânimo entre os protestantes mas não de derrota. Sendo assim, a manifestação prosseguiu o seu caminho, com o intuito de chegar a uma outra estrada que dá acesso à câmara dos deputados, desta feita a escolhida foi a famosa Via del Corso. Quando parte de nós ia a caminho dessa rua, comecei a ver os primeiros sinais da “revolução”, ao avistar fumo preto, que constatei depois ser um carro incendiado. Nessa altura a pressão subiu de tom e parecia que a qualquer momento a polícia ia aparecer e “varrer tudo a eito”. Apesar disso, o protesto continuou e chegada à rua que dava acesso à Piazza del Popolo, que consequentemente dá acesso à Via del Corso deparei-me com um cenário único, que jamais imaginei ver em Roma. A rua e no fundo a praça tinham-se tornado em campos de batalha entre manifestantes e polícias, tendo sido criadas barricadas por parte dos manifestantes, de forma a defenderem-se melhor da polícia. Obviamente que tiveram que usar as poucas armas que tinham e foi por isso que muitos objectos foram incendiados, para possibilitar a criação de uma barreira entre a polícia e os manifestantes. A certa altura, ouvi alguém dizer que na Via del Corso e na Piazza del Popolo não se encontravam apenas polícias e Carabinieri, mas também o exército, o que demonstra claramente a violência exercida pelas “forças de ordem”, contudo eu só consegui avistar os Guardia di Finanza, que é um corpo especial da polícia italiana.
Nós que nos encontrávamos no cimo da rua começamos a criar cordões para nos podermos defender quando as barricadas fossem destruídas. No entanto, e devido à confusão a certa altura foram atiradas bombas de fumo que não consegui perceber se foram os manifestantes que estavam mais à frente a fazê-lo, devido ao caos que estava ou se foi a polícia. Nesse momento, a parte do cortejo que restava dispersou por várias estradas e acabámos por penetrar na zona conhecida como a área rica de Roma (do lado direito do rio Tibre). Após alguns minutos, a calma estabeleceu-se, mas como a manifestação se tinha dispersado, não foi possível continuar o protesto, até porque já não podíamos avançar para a Piazza del Popolo ou Via del Corso porque os acessos estavam impedidos. Foram presas cerca de cinquenta pessoas pelo facto de se oporem à política corrupta de Berlusconi e por terem decidido exercer o seu livre direito de manifestação [Ver vídeo].
Eu assisti à revolta dos estudantes italianos e não como ouvi na televisão italiana que eram os delinquentes, os desordeiros que estavam a revoltar-se. Penso que para muitos italianos já chega de repressão, já chega de corrupção, já chega de bloquear o futuro (o caso dos jovens), já chega de democracias aparentes e os acontecimentos de ontem mostraram isso mesmo. As pessoas chegaram ao limite da paciência e ontem saíram à rua em força. Agora, esperamos nós que o dia de ontem tenha sido o início. Prevê-se uma discussão da reforma da educação na câmara dos deputados nos dias 21 e 22, será que vamos voltar a ver Roma a ferro e fogo? Por fim, queria salientar ainda, que os estudantes (na sua maioria) manifestaram-se autonomamente, sem intenções partidárias por trás. Será que é a autonomia que nos falta?
Laura Dias
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