terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

«O que eu penso das praxes», por Antonino Solmer

Eis que nos chega a décima primeira contribuição para a nossa rúbrica «O que eu penso das praxes». A lista completa pode ser vista na coluna lateral direita.

Antonino Solmer (n. 1950) é actor e encenador. Formou-se na Escola Superior de Teatro e Cinema de Lisboa e estagiou na Polónia. Trabalhou, entre outros, com os encenadores Ricardo Pais, Jorge Listopad, Fernanda Lapa e Osório Mateus. Encenou textos de Handke, Schnitzler, Rozewicz, Herberto Hélder, Brian Friel, Gabriela Llansol, Yourcenar, Y. Ritos, José Triana, Hauptman, Lorca, Ibsen, Strindberg e Martin Crimp. Fundou e dirigiu a companhia ContraRegra. Foi professor de teatro no Conservatório Nacional e integrou o ACT - Escola de Actores. Foi director do Teatro da Trindade e subdirector do Teatro Nacional D. Maria II. No cinema, trabalhou, entre outros, com João Mário Grilo e Fernando Matos Silva. Na televisão com António Escudeiro, Ferrão Katzenstein e Jaime Campos e integrou o elenco da série Duarte & Companhia e da telenovela Terra-Mãe. Dirigiu espectáculos musicais para Sérgio Godinho e Emilio Cao. Ver mais aqui.



O QUE EU PENSO DAS PRAXES


Circularidade duma afirmação mais ou menos irracional como numa bebedeira.
Um editor amigo dizia-me: Porque é que continuamos a publicar mais, sempre mais, e a vendermos menos, cada vez menos? Porque estás a cavalo numa bicicleta. Se parares de pedalar, cais. Tens a sensação de que perdes, que não acompanhas o outro.

“Como no poço da morte, como no poço da morte…”

Há uma força centrífuga que te torna herói ou te distingue.



As capas sempre tiveram propósitos. Ao longo da história.
Foram adoptadas as negras. Curiosamente como em Espanha, como negros são as borlas e chapéus académicos do Brasil.


Ritos de iniciação. A “caloiros”.
Quem sabe já o que são esses ritos?


Nos anos sessenta, paquete de uma companhia de seguros, mandaram-me ir do 3º andar ao r/c buscar o “livro dos mortos” dos anos trinta. Disseram-me que eram aqueles tantos calhamaços encadernados e o mais que houvesse…
O meu pai recebeu um aprendiz que dizia “frosfaz” em vez de esferográfica; e “frifo” em vez de frigorífico. Fizeram-lhe uma “amostra”, consistindo isso numa exposição dos órgãos genitais onde todos podiam cuspir. A este, por último, puseram-lhe massa consistente a cobrir os pêlos dos colhões. O jovem chegou a casa e teve se ir lavar ao ar livre, fora da vista da família que vivia numa barraca.


Qualquer feiticeiro ancestral, dum qualquer povo recôndito e “subdesenvolvido”
ficaria incrédulo com tal rito e tal iniciação.
Qualquer autor de Harry Potter transcreverá ritos galhofeiros, pelo meio da trama,
duma forma que acrescenta uma finalidade positiva.



O rapaz do “frofaz” e do “frifo” chegou no outro dia para ganhar o seu salário.
Contou com melancolia o que teve de passar para lavar os colhões na água fria. E estava sorridente.
E eu percebi que a sua solidão continha o medo da afirmação que o desprenderia do “costume”.
Que o despenderia da “maioria”. Que tudo isso o levava ao exercício e aceitação de uma fácil e autoritária hierarquia.


“A referência é o patamar de cima.

- Como no poço da morte, como no poço da morte… -

Um desejo de ascenção e até de identificação com quem já lá esteja. Uma vez lá chegados, naturalmente, acamaradamos com os que ali se encontram e, recordando as provações passadas, traçamos os limites corporativos do patamar.
E torna-se evidente que tudo isto pode valer. Como prova de um sistema baseado no primado do poder.”


As capas sempre tiveram propósitos. E histórias cuja densidade tiveram identidade e história.
Tradição? Sim!
Mas qual?


Esquecemo-nos no tempo como Coimbra (a das capas) para uns é Choupal, Pedro e Inês, serenatas às raparigas, Menano e Luís Góis, Zeca Afonso,
Adriano, e ainda Antero.
E para outros mais a cidade conservadora que ainda vence.
A cidade da obscura espera
de Cerejeira e Salazar, antes do ataque.


As boas tradições são aquelas que perduram na senda do futuro.
Que perseguem uma Obra e uma Construção.


Hoje, o respeito pelos homens e pelos Direitos Humanos, exigem das autoridades,
a começar – logo, evidentemente – pela autonomia dos movimentos associativos –
o exercício das responsabilidades que lhes são inerentes.

1 comentários:

Anónimo disse...

Caríssimo,

Não percebi a ponta de um real fedelho daquilo que tu escreveste. Se calhar a tradição obriga-te a pôr em prática a tua escrita nos momentos de menor lucidez da tua pessoa.
Quanto ao propósito do blog, acho muito eloquente. Mais, acho importante existirem duas extremidades, só assim poderá existir um equilíbrio. Fui praxado?Fui!Voltaria a ser praxado?Sim.
Na minha opinião, o cerne da questão reside no facto da praxe ser simplesmente BOM SENSO. Obviamente, que existirão sempre maus praxistas, extremistas na abordagem que assumem na relação com outra pessoa. No entanto,existe e existirá sempre o oposto aos maus exemplos.
Acho má política falar mal de algo que, por vezes, desconhecemos. Enfim, espero que esta opinião sirva para uma discussão saudável.

Até mai logo

António de Salazar Carvalho e Melo