quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Évora: estudantes manifestam-se... pela praxe e tradição???

Estudantes de Évora protestaram contra restrições às praxes
Público (nº 6790, 02.11.2008, pág. 24) - M.A.Z.

O Dia da Universidade de Évora foi ontem marcado por um protesto de estudantes contra as limitações impostas pelas autoridades académicas à prática das praxes. Cerca de 600 alunos juntaram-se no claustro maior da instituição, trajados a rigor e empunhando cartazes a apelar à "tradição académica". A música das tunas deu lugar ao silêncio e o acto de estender as capas para que o cortejo académico passe por cima delas foi substituído por um virar de costas aos docentes. Para o Conselho de Notáveis, órgão constituído por alunos das diferentes licenciaturas, esta foi uma acção que visou mostrar a sua indignação com as medidas tomadas pela reitoria. "Esta foi a forma encontrada para mostrarmos que somos a favor da tradição académica e da praxe, devendo a Universidade assumi-la como sua, respeitá-la, e compreendê-la, ao invés de a afastar e rejeitar, uma vez que a praxe vai continuar a existir", afirmou Hugo Quintino, membro daquele conselho. O reitor Jorge Araújo disse, por seu lado, que os alunos estavam no seu direito de se manifestar, lamentado, contudo, o facto de "não reagirem relativamente a coisas muito mais graves que acontecem, dando a ideia de que a capacidade de indignação dos estudantes se resume às praxes". Jorge Araújo salientou que as praxes protocolares não estão proibidas, "o que está proibido são as alarvidades como gritar, chafurdar, sujar e todas as práticas que no fundo podem atentar contra a saúde física e psíquica dos alunos".

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5 comentários:

Anónimo disse...

Opinião de João Baía em "A Cabra":

Esta notícia é curiosa;)
Será que o PC tem razão? Que a luta contra as restrições aos abusos das praxes pode ser uma causa mobilizadora das "massas" estudantis. Eu acho que não ou que não deveria ser pelas razões que apresento num texto que escrevi em 2006. Houve um dia que decidi escrever uma "carta ao director" no jornal universitário de Coimbra em que tentava, no contexto daquela universidade, no começo da aplicação de Bolonha, compreender a relação entre luta e praxe. Pensei que Bolonha ao menos pudesse servir para abanar os pilares da praxe... Mas enganei-me. Pelo menos do que já vi este ano em Lisboa em algumas faculdades.Carta ao DirectorA Praxe integra?A discussão sobre a praxe já é antiga: entre os praxistasconservadores e os praxistas progressistas, ouentre os praxistas ortodoxos e os praxistas renovadoresou então entre os que são “pró” ou “anti” praxe.Num momento em que a praxe atravessa uma crise avários níveis, é importante continuar a discutir acercadas práticas que formam a praxe. Tentando contribuirpara este debate que atravessa algumas gerações resolviescrever um texto para o Jornal Universitário ACabra, que julgo ser um espaço apropriado, onde asvárias sensibilidades e opiniões podem e devem ser expostasde forma a mostrar a diversidade existente nanossa academia.A praxe é uma das muitas tradições da Universidadede Coimbra. O movimento anti–praxe faz parte da tradiçãoe a contestação estudantil também faz parte datradição. E quando comparamos a afluência dos estudantesàs Assembleias Magnas e às manifestações,com a afluência às praxes no início do ano, notamosque há uma clara discrepância. Por isso considero quea praxe pode ser uma forma de integração no mau sentidoda palavra.A praxe integra de forma a apaziguar o ímpeto demudança dos jovens chegados à cidade de Coimbra,condenando qualquer pessoa que ouse ser diferente,que ouse colocar instituições em questão, que ouse colocarideias, sofismas em questão, ao fantasma da segregaçãoe isolamento. Para mim, a praxe contribui paraconstruir uma universidade contrária àquela que eugostaria que existisse.Gostaria que a Universidade de Coimbra estivessecheia de espíritos curiosos irreverentes, participativos enão passivos, que problematizassem as matérias leccionadas,que as discutissem e que as criticassem.Uma universidade em que os estudantes possam olharolhos nos olhos, sem ter que chamar doutor a um colega.Uma Universidade sem hierarquias entre os estudantes(baseadas no número de matrículas) e que asnovas ideias, práticas e valores dos novos alunos fossembem vindas. Uma Universidade onde ninguém sesentisse molestado fisicamente ou moralmente nas ditasbrincadeirazinhas que não ofendem ninguém. Consideroque a praxe no tal papel que reclama, de integraras pessoas, é conservadora e reacionária à diferença.Se há praxes que afectam moralmente, psicologicamentee por vezes fisicamente pessoas, mesmo queestas sejam poucas, já é argumento suficiente paraacabar com elas. Podemos constatar que existem brincadeirinhas,que para uns não passam disso, mas paraoutros provocam danos morais e psicológicos. A praxeno seu dia a dia é sexista, machista, homofóbica e antiquada.Quando as praxes foram abolidas ninguém deixou deter acesso a apontamentos de colegas, nem deixou deter a possibilidade de fazer amigos. Hoje em dia, se aspessoas tentarem ser um pouco mais curiosas, encontrammúltiplos espaços no seio da universidade de confraternização,de construção de projectos, realizaçãode sonhos que estão cheios de histórias e tradições,onde ser praxista não é um requisito.Espaços como as repúblicas, como o CITAC, A Cabra,a RUC, o GEFAC são alguns dos exemplos que conheço.Considero que as pessoas envolvidas na praxe estãomuito pouco curiosas e informadas acerca do projectode Bolonha, que irá trazer várias mudanças no ensinosuperior, nomeadamente na praxe. Com Bolonha, algunsdos pilares simbólicos da praxe começam a serabanados...os cerimoniais do baptismo, de ir no carrono cortejo da Queima, de usar a cartola no último ano,o rasganço, será que fazem sentido com três anos delicenciatura? Será que três anos nos vão conferir algumaformação especial que nos possa distinguir dos cidadãosde Coimbra?Será que faz sentido haver um traje? Só se a praxefizer como as poderosas ordens e disser- “só entra nonosso esquema quem completar os dois ciclos de formação”.Pois aí a praxe vai começar a excluir dos seusrituais muitos estudantes que não têm dinheiro parapagar propinas do segundo ciclo, vai deixar de “integrar”os novos alunos carenciados. Como essa luta nãoé minha - a da adaptação da praxe ao projecto de Bolonha- não me quero preocupar muito com isso. Achoque a praxe vai passar mais uma crise na sua existênciae espero que acabe de uma vez por todas.

João Baía
Retirado de "A Cabra"

Anónimo disse...

CARTA ABERTA AOS ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE DE ÉVORA



Caros estudantes,


O culto pelas tradições é próprio das organizações humanas e consubstancia, no essencial, uma dinâmica identitária e de transmissão de valores. Nas universidades mais antigas, fazem parte da tradição, as praxes, as quais são rituais iniciáticos mais ou menos assumidos.

Ao longo dos 450 anos da história da Universidade de Évora, muitas praxes se perderam na bruma dos tempos, como a "tomada da pedra" (século XVI) em que o estudante doutorado se sentava no chão, em cima de uma pedra, fazendo prova de paciência e de modéstia enquanto os "tentadores" o invectivavam com opróbrios e desprezos. Outras alteraram-se e adaptaram-se às circunstâncias; outras ainda foram sendo adicionadas.

As praxes foram, em todos os tempos, rituais iniciáticos aos quais, em geral, se associava um vexame - vexatio - que encerrava o duplo rito de humilhação e de inversão de estatuto, e tinha a ver sobretudo com a integração do neófito no colégio dos doutores. Hoje, esse princípio conserva-se nas praxes de integração dos alunos no ensino superior, os "bichos" e assinala a transição para o estatuto de "caloiro" ou, de forma mais genérica, para a vida adulta.

Na Universidade de Évora, a tradição que me cumpre perpetuar é, acima de tudo, o respeito pelos valores do humanismo; que enquadram o respeito pela pessoa, isto é, pelos seus direitos fundamentais, individual e colectivamente considerados, pelos seus valores e, também, pelo seu equilíbrio psíquico e saúde física.

Consequentemente, será no cruzamento das duas tradições, do respeito pelos direitos humanos, por um lado e, por outro, do "vexame" iniciático, que terá de ser encontrado o equilíbrio "justo" de comportamentos que interdite qualquer travessura que fira a dignidade ou atente contra a saúde ou o bem-estar de alguém ou ainda, que prejudique o bom nome da Universidade, o funcionamento das aulas e o rendimento escolar.

Desde há vários anos, tenho vindo a exortar o Conselho de Notáveis a exercer um magistério de influência, moderador em todas as sequências de actos que compõem as praxes, de cuja tradição eles são garantes. Todos os anos, contudo, se assiste a uma deriva para níveis comportamentais inadmissíveis, de alguns, quer pela violência psicológica que lhes é inerente, quer pela boçalidade e alarvidade com que são concebidas e praticadas as praxes, quer pelo desrespeito pelos cidadãos de Évora, pelos professores e por todos os alunos que não aceitam este tipo de praxes como forma de integração na academia. Chafurdar no esterco do gado não é, de todo, um acto de cultura como pretende o Sr. Presidente da Associação Académica. É uma imundice, potencialmente perigosa para a saúde. Tão pouco é um acto de cultura incentivar outrem a beber até à inanição ou apregoar obscenidades pelas ruas.

Acima do respeito pelas praxes, estará sempre o respeito pelo bom-nome da Universidade e pela dignidade dos alunos, dos professores e dos cidadãos de Évora. Ninguém põe em causa a tradição, mas questiona-se e condena-se a forma como ela é posta em prática. O que verdadeiramente está em causa é um legado académico, cultural e científico que nos cumpre honrar, respeitar, perpetuar e enriquecer. Estes são os deveres que incumbem a todos os que hoje podem frequentar uma universidade que se orgulha do seu papel humanizador e humanista, secular; esta é a obrigação que cada um tem para todos aqueles que fizeram com que hoje, este seja o vosso espaço de preparação para a cidadania e para a vida activa.

Assiste-nos a todos o direito à indignação. Alguns estudantes indignaram-se por terem sido impostas limitações às praxes nos espaços da Universidade.

Como ex-dirigente académico, como professor e como Reitor, indigno-me pela apatia cultural e política dos estudantes, pela indiferença que manifestam face às dificuldades que a sua Universidade enfrenta, as incertezas que afectam o futuro colectivo dos portugueses, as violações de direitos humanos que grassam pelo mundo.

Este é o direito inalienável que me assiste de expressar a minha indignação.



Universidade de Évora, 3 de Novembro de 2008


O Reitor

Anónimo disse...

Protestos do secundário - ao menos esses não andam a lutar pelas praxes!

Contra o regime de faltas e a pedir a demissão da ministra
1500 alunos do secundário protestam sob forte chuva em Lisboa
05.11.2008 - 11h17 Lusa

Perto de 1500 alunos do ensino secundário estão hoje a manifestar-se em Lisboa, sob forte chuva, contra o regime de faltas criado pelo Estatuto do Aluno e exigindo a demissão da ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues.

Pouco depois das 10h30, os alunos saíram do Marquês de Pombal em direcção ao Ministério da Educação, na Avenida 5 de Outubro, obrigando ao corte do trânsito na Avenida Fontes Pereira de Melo, no sentido Marquês - Saldanha.

Segundo o subcomissário da PSP Silvério Costa, estão a dirigir-se para o Ministério cerca de 1500 alunos. Já o coordenador da Plataforma Estudantil "Directores Não!", um dos movimentos que dinamiza o protesto, assegura que "há mais de 1500" estudantes na manifestação.

No protesto encontram-se alunos de escolas secundárias dos concelhos de Oeiras, Lisboa, Loures, Odivelas e Sintra, sendo que, segundo os alunos, as secundárias Camilo Castelo Branco, Amélia Rey Colaço e Luísa de Gusmão foram mesmo totalmente encerradas.

"Está na hora de a ministra ir embora" é a palavra de ordem proferida na manifestação, ao longo da qual há várias faixas onde pode ler-se: "Não há ministra que corte a raiz ao movimento", "A educação não é um negócio" e "Diz não ao Estatuto do Aluno".

Os estudantes do ensino básico e secundário realizam hoje um "Dia Nacional de Luta", com manifestações um pouco por todo o país contra o novo regime de faltas e a criação da figura do director nas escolas.

Anónimo disse...

Protestem também contra as praxes no secundário, que pelo menos nas escolas que conheço começaram à bem menos tempo que nas universidades e não têm objectivo nenhum para além de ridicularizar os novos alunos (maioria deles com 14 ou 15 anos, uma altura bem mais susceptível de traumas psicológicos).
Em relação ao "chafurdar" nos dejectos de animais, essa praxe em especifico é, ou era pelo menos na altura em que a ela fui sujeito, de 1 ou 2 cursos da universidade: Eng Zootécnica e Medicina Veterinária. Não me arrependo de nela ter participado e acho que serve para os novos alunos perderem um pouco do nojo incutido socialmente em relação aos dejectos dos animais, dado que ao longo do curso e da vida profissional provavelmente irão ser sujeitos a coisas similares ou piores sem que sejam consideradas praxes ou atentados à dignidade, e apenas como derivado da vida profissional... Eu que diga as vezes em que já fui alvo de fezes de animais durante a minha vida profissional... Façam enemas a cães ou gatos e venham-me falar do cheiro... Apanhem com fezes de animais doentes com Gastroenterite e venham-me falar de perigo para a saúde.
Esta praxe é uma praxe especifica de certos cursos que serve para que os novos alunos tenham um choque e percam a maioria das inibições que têm em relação a certas "regras sociais"... Agora sujeitar meninos de cursos que nada têm a ver com isto não acho bem.

DS

Unknown disse...

Deves estar a gozar, só pode.

Acho que não chafurdar em merda de animais não é uma regre social, é bom senso.

Duvido que para se ser um bom veterinário se tenha que passar por esses mergulhos. Obrigarem uns tipos a chafurdar na merda só pode servir de divertimento (sádico) dos que os obrigam, não os prepara para nada.

Quem acredita nessas desculpas ainda bem que não é médico de humanos (sem menosprezar os animais, obviamente).